segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Velas

 

Há pessoas que são como velas na nossa vida. Tomara ter uma ou ter tido uma, uma vez que fosse, tomara poder recordar que uma vela ilumina e vive em redor. Por ser vida, melhor seria tê-la sempre acesa, próxima, ao meu lado, minha... Se assim não for, ao menos que ilumine o passado, que aqueça recordações.

Nasceram para nos iluminar as noites escuras e trazer um pouco de calor nos dias frios...

Velas que se acendem e nos acendem, que aquecem… que queimam…  que se gastam e acabam, também.

Um dia descobrimos que há um côto sujo e gordurento que teima em ficar no castiçal do costume, meio aceso meio apagado, com vontade de sair dali … de deixar de o ser, de abandonar o seu ar bolorento de vela velha, de vela que já não pega e já não quer ser de novo fresca e inteira… 

É uma vela velha, cansada e com vontade de partir e de abandonar os seus “iluminados”, que despreza os seres humanos com coração, que quase prefere transmutar-se em pedra de gelo... coisa que também derrete e desaparece. Ou que pensa virar faca afiada que fere e que magoa, vela má ... farta de tudo, egoísta que prefere cortar a amar.

Mas há quem teime e se agarre ao velho coto amachucado, há quem lamba os pingos de cera que deslizam lascivos borda abaixo, há quem lamba os beiços da miséria endémica de que sofre e saboreie a merda podre de uma velha gasta, como se aquela fosse fonte de potencial calor e vida, pensando que assim sobreviverá... e se transformará, não de sapo em príncipe encantado, mas num doce gelado derramante do Santini.

A miséria vê diamantes nos pirilampos e amor no doce afago do egoísmo.  A miséria endémica só vê disparates, alimenta-se de ilusões, contenta-se contentinha, come pouco... e imagina muito. Espera e luta.

Coitada da velha que contempla a vela embevecida, definhará acreditando que um dia a tal vela velha será sua e luminosa. 

Coitada da vela velha que não admite que tem um bom castiçal, que poderá ser uma vela novinha e colorida e que poderá voltar a iluminar a alma de quem lhe  quer bem.

Nada se perde na natureza e a cera é tao maleável quanto o amor, tão transformável em novas velas quanto a imaginacao e o desejo o ditem.

Derretam a vela velha, a cera carcomida pela chama, suja pelos beijos que rolaram no chão, torta de tanto amasso, linda de tanto calor que emitiu. Derretam-na e misturem purpurina de várias cores, juntem brilhos, façam riscas, pintem arco-iris e dêem beijos  - uma nova vela se incendiará, massa transformada do antigo amorfo moribundo.

Há vida para além da vela apagada e da porcaria feita por quem derreteu e estragou tão bela luz, por tudo querer... 


quinta-feira, 6 de outubro de 2022

O Dia da Tranquilidade


Ainda não chegou o meu dia da tranquilidade. O dia quieto e parado em qua a alma se deita sossegada, à luz do sol ou no limbo da noite, em que o corpo habita feliz um espaço de rotinas doces, certas e gratificantes. Em que as contrariedades ou as tristezas, que possam surgir, encontram um fluxo de regeneração saudável e natural… integrado na fluidez da vida.

O dia da tranquilidade - que a esperança colocava no lugar da reforma - não chegou na hora devida. Puro engano pensar que seria o resultado natural da ausência de responsabilidades profissionais, que acabariam com o fim de todo um turbilhão de decisões, confusões e tarefas mais ou menos conflituantes e stressantes que o trabalho comporta. Não chegou ainda…o meu dia da tranquilidade.

Para uma alma inquieta, com vários focos de interesse, com uma corrente de vida partida em bocados que não convergem, esse dia talvez seja uma miragem.

Para cada problema resolvido, cada angústia amansada, surge outra latente, que estava guardada.

Concluídos com êxito relativo os objetivos principais, deveriam ter secado as fontes de angústia: os problemas da insegurança por não ter casa, a negociação da reforma e o encerramento responsável das atividades de 45 anos de carreira, razoavelmente conseguida, a doença e apoio aos pais, a saúde da família e o nascimento e crescimento saudável do neto, tudo foi correndo bem … a ansiedade poderia ter sido ultrapassada… mas não foi.

A minha instabilidade é interior e mais ditada pelo mundo dos afectos do que pelas questões logísticas. 

É interior mas também exterior porque não tenho lugar numa rede de afectos una e interligada, em que todos os amigos e familiares se conhecem e me conhecem, que se conjugam para me verem como eu sou e me ajudarem como podem. Vivo com um pé num ambiente, a cabeça e o coração noutros espaços… com outras pessoas que não se conhecem, nem são susceptíveis de se misturar. Vivo saltitando e escondendo os vários pedaços da minha vida, repartida, estratificada, espartilhada… por vezes oprimida pelas convenções, que me obrigam a manter separados os vários ambientes que constituem o meu mundo exterior. Vivo de mochila às costas por aí, sem pousar. A única vantagem é a liberdade de não ter de dar contas a ninguém das minhas andanças. Porque não pertenço a ninguém, nem a minha intimidade, desejos ou sofrimentos interessam aos outros … nos vários grupos em que cirando. Estou só para o melhor e para o pior.

Ninguém gosta de mim  com a seriedade e profundidade que mereço. Ninguém se importa, ninguém se esforça para, com afecto, me retirar desta prisão invisível de egoísmo, desintegração e desamor.

E é nesse interior em ebulição, um mundo de inseguranças e incertezas, carregado de nevoeiros e de medos, onde no horizonte se posicionam nuvens negras que, em qualquer altura num futuro próximo, podem virar tempestade, sem amor e sem sossego, que reside a angústia, a intranquilidade permanente. 

Não sei se alguma vez sentirei a tranquilidade dos dias iguais e seguros. 

Tudo muda à nossa volta, é assim o Mundo. 

Ora então, se a instabilidade é a regra como esperar que individualmente eu consiga ter estabilidade e paz?

As pessoas que me rodeiam vão passando, os amores também.

As relações laçam-se e deslaçam-se…

Esmorecem e são substituídas por outras. Pensa-se sempre que se muda para melhor…

Talvez sim, talvez não.

O medo permanece, sobretudo, o medo de perder os pilares de afecto em que tentamos ancorar a nossa vida. Eles vacilam, são abanados por mãos maléficas ou invejosas ou, simplesmente, são partidos, deixados cair e abandonados no chão .

Um pilar feito de fraco material deteriora-se e fica carunchosa. Mesmo de pé, já não sustenta uma alma inquieta. Que abana sempre … empurrada pela força da história pesada que carrega, esgravatada pela mão pesada que tenta afastar, arrasar, destruir quem pode ser um impecilho… para proveito próprio, esperando que a lei do maior forte prevaleça, dê a vitória a quem for mais persistente, resistente e determinado.

Perante esta realidade, incontornável, só há duas atitudes possíveis: partir ou ficar.

Partir é um grito de liberdade mas também um tiro no escuro, um futuro cheio de vazios.

Ficar é aceitar o sofrimento como estado permanente, aguentar a dor sorrindo. É perceber que nos intervalos das angústias recorrentes talvez haja breves momentos de paz  relances de felicidade pontual… raios de sol de pouca dura.

Ficar é viver um dia de cada vez, tentando absorver o máximo de coisas boas que ele comporta e aceitar uma vida miserável… sem tranquilidade.

No dia em que atingir a tranquilidade, já cá não estarei.

Talvez alguém ocupe o meu lugar e ganhe a suprema tranquilidade de descansar no lado certo da vida, junto de que quem lhe quer bem ou se deixa amar… tranquilamente.


quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Quando o nevoeiro levantar



Quando o nevoeiro levantar e um raio de sol surgir, meio a sorrir, meio morno, trôpego ou a tremer…

Tentarei acordar para um novo caminho e tentarei esquecer,

o escuro de tantos dias e de tantos anos, de tantas noites, de penumbras e desenganos…

Olharei o sol, por inteiro e nua… porque é isso que importa, esqueço o resto, o que sobra é lua… e eu não sou tua …

De noite, morro e não me vês.

Esse raio de sol, espreitando para mim, terá o sabor do ar novo, do calor fremente, da esperança que anuncia de volta o meu gosto de viver a quente, de ser gente.

Se assim acontecer, valerá a pena acordar, rir … beijar cantos e recantos do teu corpo, esquecer o cheiro acre do nevoeiro que vai partir.

Pois é, pequeno raio de sol da minha esperança, és feito de milhões de partículas celestes, que não serão demais para um coração como o meu, com tanto espaço para as albergar. 

E quando … e se … o pequeno herói,  sozinho e fraco furar a bruma cerrada e fria, teimando em não queimar em demasia almas  carentes;

E quando … e se … o amor existente se julga escasso, 

ou prefere temperaturas amenas e a luz de um raio mais baço, 

hei-de descobrir como fazer para aquecer, para brilhar, para o nevoeiro dissipar.




sábado, 10 de setembro de 2022

Nevoeiro


 Há dias em que a tristeza nos cobre como um manto de nevoeiro… 

Apesar de a meio da tarde ter surgido um pequeno raio de sol… soube-me a pouco.

Era um raio de sol morno e desviante. Parecia que não se dirigia a mim… que saltava por acaso e por hábito sobre a minha cabeça.

Um raio de sol, que do alto da sua arrogância, achava que satisfazia a minha miserável carência de algo mais, que se ria desta pobre pedinte, triste, nevoenta, a preparar-se para desistir da felicidade solar, quase que acomodada aos dias escuros, trôpegos de drogas, à espera de mais nuvens, até talvez de um tornado, quiçá de um dilúvio…

Contudo o pequeno raio de sol trouxe uma réstia de esperança que sendo diminuta, dê para não morrer de fome… para já. Estou convencida de que não haverá melhores dias, mas talvez possam existir momentos sofríveis, a que me possa agarrar para não me dissolver no nevoeiro.

Sempre com uma grande incógnita pela frente -  como será amanhã? Até quando vou aguentar este estado de angústia latente? Não posso consultar a meteorologia. 

Nem há tabelas meteorológicas para aferir do grau de nevoeiro que cobre as mal-amadas. Nem drogas que mudem o tempo, que façam chover ou tragam o sol. 

Apenas a tristeza ou a alegria que cada um consegue encontrar dentro de si - com esforço e coragem - conseguem vencer o nevoeiro. 


quinta-feira, 8 de setembro de 2022

O Medo

 

(Capela Sistina: Imagem do medo, homem sendo puxado por figura diabólica , para o inferno)

Tenho medo! Muitas vezes e de quase tudo… medo do presente “imaginado” e, sobretudo, do futuro próximo. Do longínquo, não tenho. Estarei morta, ou inválida ou demente, já não conta para aqui.

O meu medo é resultado de uma educação sobre protegida e (felizmente) sem acidentes, nem grandes traumas: não fui abusada em criança, nem violada em adulta, não vivi numa família disfuncional com bebedeiras e pancada, nao conheço a violência doméstica senão da TV, não sou órfã, nem bastarda . Tenho filhos saudáveis, dinheiro , saúde e amigos. Não tenho ainda um abrigo, mas tenho esperança de vir a ter já um tecto para os dias de chuva e para guardar os livros. Agora o que eu não tenho nem sei se um vida alcançarei, é um tecto para a chuva do desamor, para a violência verbal, nem para a indiferença humilhante . Nem estofo para aguentar demasiada mentira e traição. 

Fui demasiado mimada. Durante muito tempo, gostaram de mim e eu habituei-me mal. Pensava que bastava ser boa, para que os outros vissem e tivessem prazer em estar ao meu lado. Pensava que a minha fonte inesgotável de beijos seriam suficientes para as carências de quem me quer bem (supostamente), pensava que com amor e carinho se consegue tudo: evitar a guerra e manter um clima de conforto prazeiroso e pacífico.

Ou seja, via os outros à minha imagem e semelhança - pensava: se é bom para mim e se dou com prazer, se sou útil e me agradecem (mesmo que sem palavras), então os outros também gostam.

Mas isto é não é bem assim: é tique de menina mimada que não sofreu agruras na vida, que não carrega traumas de maior … E ele há gente com um lastro tão grande de desgraças, com vivências tristes e marcantes, que não as impede de  aceitar e de amar, da mesma maneira que eu julgo ser a única. 

Os mimados em regra são um pouco intolerantes, neste aspecto. Por não perceberem.

Tento contrariar este defeito e a vida fez-me, aos poucos, melhorar os meus graus de tolerância… de melhorar a minha comunicação com os seres diferentes e mais infelizes que eu.

Ainda não sou perfeita. A capacidade de abnegação  e de sacrifício, a aceitação da dureza com que a vida nos brinda, não se aprende de repente. Tive até há pouco tempo uma vida calma, com segurança e proteção, não passei fome, nem tive falta de dinheiro para o essencial… estou mal habituada, portanto. Tenho falta de endurance.

Não sou comparável com as aventureiras que arriscam, para subir na vida, que tiveram de largar casas.famílias e países. Que não têm  um lugar a que pertençam, nem um coração que as acolha, que tiveram azares e abusos vários, que foram traídas e mal amadas… que enfim tiveram muito treino da dureza da vida. E logo maior capacidade para resistir sem chorar.

Acho que sou corajosa quando a vida me coloca desafios e que tenho aproveitado as oportunidades quando surgem… até hoje nunca me arrependi de não ter feito algo por preguiça. Escolho o caminho mais difícil, quando é preciso optar. O que não faz de mim uma heroína. Se a Pátria precisasse de mim, daria o corpo às balas, com orgulho. Nunca aconteceu. Nem por isso sou uma cobarde ou uma cidadã que mereça menos apreço.

Agora reconheço que há gente com vidas bem difíceis e com uma capacidade de superação exemplar (ver o programa da Júlia de hoje à tarde).

A sociedade parece gostar mais dos coitadinhos que se superaram e foram corajosos, por uma questão de sobrevivência, ou ambição, do que daqueles que foram “heróis” fazendo muito bem o seu dever. Criar 2 filhos e fazer carreira custou ! E o mimo que tive, não aquece nem arrefece o meu mérito próprio, nesta matéria. Aí consegui! Sei que valorizam mais uma empresária aventureira e talvez irresponsável , do que uma mãe de família que põe sopa na mesa aos filhos todos os dias , depois de fazer 2 h de transportes públicos debaixo de chuva numa noite de inverno. Ou que arranja 2 empregos para pagar a prestação da casa. Não tem glamour nenhum. Digno de dó é quem não tem casa e vive aos caídos, porque se aventurou demasiado alto. 

Todos têm méritos e desméritos. Uns não são melhores nem piores que os outros. São simplesmente diferentes, percursos de vida diversos que até podem ter sido feito com o mesmo grau de heroísmo. 

Só que dos “certinhos” não reza a história! Os heróis apreciados são os aventureiros! 

O problema - e voltando ao mimo - é que quem nasceu e viveu mais burguesmente protegido , tem menos skills para aguentar os dias difíceis .

Sofre mais , quando falha ou é traído, porque não ganhou o calo dos duros. 

Alguém disse que depressão é doença de rico, pobre não tem tempo para isso. Aguenta!

O tal rico-mimado precisa de mais amor, carinho, conforto afetivo e prazeres físicos e intelectuais. Pobre só precisa de comer, de um tecto e de não levar muita pancada.

Claro que isto são esteriótipos.

Aonde eu quero chegar é que eu tenho medo da vida porque fui mimada (tive sorte, nasci do lado certo do mundo…) como tal, não tenho como fugir às agressões. 

Não tenho culpa da vida que tive, se tivesse nascido algures num bairro da lata da pesada, não teria medo de nada. Andava de faca na liga, conhecia os mal feitores certos para me defender ou ajudar a por em marcha os maus intentos, teria um gang para meter medo aos outros e me ajudar a pôr a vingança ao lume !

Mas agora é tarde. Estou velha e tenho medo, não conheço ninguém no bidonville mais nogento da outra banda, nem engenho para os contratar. 

Por isso tenho medo, medo de não conseguir ter uma vida direita, medo de ninguém gostar de mim, medo de falta de amor e carinho, de não ter alguém para me levar ao médico quando estiver doente, medo de que quem eu quero não esteja ao meu lado para evitar o abuso dos Lexotan e afins, medo de não conseguir deixar de chorar… medo de partir deste mundo (e já falta pouco) sem me cumprir, sem me realizar como pessoa boa que julgo ser … medo de tão ter feito bem o meu papel de ser util… medo de não ser capaz de me fazer compreender.

Medo de estar só ( não fisicamente) mas só em afetos e compreensão. De passar dias e dias sem ter um ombro onde chorar, um telefone para onde ligar.

Estou farta de ter medo. De apanhar sem merecer… sem ter coragem de fugir …

sábado, 3 de setembro de 2022

Os Três Pilares

Li algures que os três pilares de uma boa conjugalidade são:

  - A Solidariedade

  - A Vida sexual

  - A Vida afectiva

Qual castelo amuralhado, a nossa vida deve assentar em algo de sólido.

Talvez a palavra “deve” esteja a mais - reformulo: era bom que tudo fosse sólido e seguro, mas não é. A mais das vezes, é uma frágil casquinha de noz, flutuando ao sabor da corrente.

Refletindo sobre o assunto - e apesar de não viver, no presente, uma relação em que o termo “conjugalidade” se aplique na íntegra, achei interessante e pertinente aquela arrumação em pilares.

Claro que quando se fazem classificações e tentativas de sistematização de conceitos complexos, sob o nome de palavras simples, corre-se o risco de deixar de fora coisas importantes. Não obstante, com um pouco de imaginação é possível arrumar o que importa nos três pilares identificados.

Com o que aprendi por mim mesma e observando as relações dos que me são próximos ou daqueles que foram passando pela minha vida, colecionam-se saberes e experiências nossas ou alheias sobre este universo tão rico e complexo que é a nossa felicidade interior, quando esta assenta num parceiro, numa parceira ou em múltiplos afectos, que dão sabor à vida. Aquelas coisas que se estiverem bem arrumadinhas em cada um dos três pilares fazem de nós a perfeição perfeita, uma divindade da felicidade absoluta, uma enormidade romântica inexistente … mas que a fantasia e o sonho não desistem de nos fazer pensar que são possíveis de alcançar. 

Deve ser sinal de infantilidade, ainda acreditar … acreditar em castelos duradouros e inexpugnáveis, habitados por princesas lindas e amadas.

Mas então é assim: se os pilares fossem perfeitinhos, construídos sobre pedras sólidas, direitas e bem posicionadas, se o arquiteto fosse um gênio e eu uma princesa, cada um dos pilares teria a seguinte composição:

- Solidariedade - cumplicidade e intimidade total, o que implica transparente gosto em ajudar o outro (ou outros), privilegiar o interesse alheio, estar atento aos gostos, antecipar desejos … ser uma espécie de gueixa moderna. Pronta para ajudar na doença, no amor, nos desaires da vida, nos dias de sol e de chuva. Pronta para usufruir em conjunto os prazeres que se sabem prazeirosos e comuns, e também, respeitar os momentos em que os gostos próprios são diferentes. Há alturas que ditam a necessidade de descanso, de afastamento ou de solidão transitória (exemplo mais trivial é deixar ver um jogo de futebol, sem interromper, nem mandar bojardas, se não se percebe nada do assunto).

Solidariedade é também reconhecer a necessidade de espaço próprio do outro.

Mas é, sobretudo, garantir que a solidariedade funciona igualmente para ambas as partes - o que um dá, é suposto o outro retribuir (em espécie e tempos distintos). Não se trata de uma contabilidade exata e pontual, mas de um compromisso permanente de entre-ajuda, que deve funcionar à medida das necessidades e possibilidades casuísticas.


- Vida sexual: aqui deve-se fazer um reparo muitíssimo importante: Lição número 1 (que só uma mulher é capaz de ensinar) é que a vida sexual “conjugal” não tem de acabar nunca! Um homem, que em geral nestas coisas é mais básico, diria que acaba... um dia.

Deve é adaptar-se às contingências da idade ou da saúde. A Lição número 2 (só disponível para quem passar com aproveitamento na primeira) daria para várias páginas, que não cabem neste blog. Basicamente,  importa reter que o desejo tem de existir sempre, mesmo que o desempenho sexual esmoreça. E quem pensa o contrário, que acha que o seu desejo pela parceira (o) desapareceu ou amainou, aí é porque muito mais coisas já se foram embora.

É que o desejo - que mora na cabeça e não numa zona algures da cintura para baixo - se manifesta de muitas maneiras: desde ter prazer em tirar a lingerie sexy (de preferência!) e ficar a olhar, em dar um beijo hollywoodesco no banco de trás do carro… passando por muita pele, muito creme, muita masssagem, muito lambe-lambe e, sobretudo, por muita risada relativamente a isto tudo.


- Vida afectiva: para um homem chegar a esta lição é quase tão difícil quanto tirar um MBA numa universidade estrangeira, daquelas muito caras em que as aulas são todas em japonês. Poucos estarão à altura. O pilar, tão simples para uma mulher apaixonada, é uma tragédia para o seu parceiro (que ficou pela segunda classe mal tirada) e se julga um doutor.

Claro que há exceções - homens raros e especialmente sensíveis para perceber esta matéria. Homens que gostam de beijos e de abraços, com a pessoa amada, de afagos com quem querem bem, mesmo sem estarem estupidamente apaixonados, que gostam de conversas doces, etc. etc... tantos e tantos carinhos sem terem como objetivo único e imediato o "salto para a cueca".


Uma mulher apaixonada e que gosta de carinho e afecto, tem cara de parvinha, atrasada mental, que só traz complicações para uma relação a dois …
Percebem com muita facilidade, mesmo aquelas que não o sabem expressar com clareza, que uma vida afetiva feliz e partilhada, é uma base de solidez indispensável.


Muitos são os escolhidos e poucos os eleitos... 
Os homens que ainda não conseguiram aprender o valor da vida afetiva para a solidez de uma relação, ainda não foram eleitos ao patamar da solidez gratificante, da relação ou das relações em que vale a pena investir.


O Outro Lado do Espelho






Quero poder conversar livremente com quem me é íntimo e querido. Preciso de ver e de ouvir quem está do outro lado do espelho, saber a opinião que tem sobre mim. Olhar-me ao espelho e ter retorno: bom ou mau.
Um espelho interativo e não uma superficie refletora e fria, que nada me diz. Ou pior ainda, um espelho que me transmite uma cara estranha... na qual não me reconheço.

É normal que quando se convive muito tempo com alguém e, simultaneamente, se criam elos de proximidade, envolvidos em afeto - que podem ser de maior ou menor intensidade, mas genuínos e reais - se considere possível transmitir uma ideia clara daquilo que somos.  

A expetativa de que, a quem eu quero bem, me conheça igualmente bem é legitima. Logo eu, que gosto de transparência e intimidade.

Contudo, eu não sei qual é a ideia que fazem de mim! Não sei quem sou no olhar do outro, no olhar de quem mais preciso e me importa, não sei que imagem projeto no espelho onde os amigos ou a família me vêem. Isso intriga-me, deixa-me insegura e desconfortável. 

Eu sei quem sou, conheço-me razoavelmente bem. Mas os outros - os que interessam - o que sabem de mim, até que ponto se preocupam com o meu sentir? Terei de escrever um diário ? Uma auto-biografia? Para ser lida por aqueles que me vêem mas que pouco se importam com o que penso ou como me sinto.

Sei que preciso de amor e carinho (como toda a gente) mas reconheço que não consigo beber na fonte habitual, esse bem de primeira necessidade. A família ignora-me - enquanto ser humano com vida interior, que precisa de ajuda em tempos difíceis - os amigos mais especiais (para mim) julgam-se muito especiais para eles… Tenho tendência por me esbarrar em pessoas auto-centradas, autistas ou mesmo um pouco egoistas. Dos que dizem: os problemas dos outros … que sejam eles a resolver…

Ora , eu preciso de ajuda! Estou só, perdida e arrisco, em cada dia, não fazer as escolhas certas. Há demasiada gente perfeita que concorre comigo - eu que sou uma mulher cheia de imperfeições, mau feitio, refilona, amarga, desbocada, disparatada, apaixonada, disléxica e complexa.

Apesar dos defeitos, acho que tenho bom coração, tenho mesmo quase a certeza que sim... apesar dos ataques de raiva e desejos de vingança que teoricamente me assolam.

Claro que o bom coração não se vê no espelho... Apenas as rugas, o sorriso amuado e as bocas foleiras ficam na memória e na imagem dos outros. Saber porque atiro com as portas ou tomo comprimidos para dormir (e desaparecer umas horas) não suscita a curiosidade de ninguém, porque não se adivinham as causas, nem se vê a olho nú. 

A menos que seja alguém que consegue ver para além do espelho, que leia a alma, que se sinta motivado a conquistar a intimidade total... objetivo limite inatingível mas excitante!

Sei que chateio quem não devo, porque é esse mesmo “quem não devo” que eu gostaria que me ouvisse. Outras flores alegres e felizes preenchem os tempos de doçuras fofas e sorrisos permanentes. Nada exigem e sabem montar um cenário agradável de companhia leve e confortável. Lavam a cara em casa e não precisam de levar espelhos, porque se sabem bonitas e bem maquilhadas. A alegria e a conversa suave são o melhor dos cosméticos.

Se precisavam de espelho, deixaram-no em cada uma das suas casas… e mostram-se auto-confiantes, lutadoras, vencedoras e felizes. 

Eu não! Quero ver e saber tudo o que pensam de mim… já agora de imediato.

Gostaria de ouvir críticas e elogios, meiguices e paliativos para minimizar a dor, a angústia que cresce… e que não pode continuar a ser tratada com químicos que me fazem uma zombie, que anda por aí aos tombos.

“ Quero (como alguém disse) saber quem eu sou quando oiço as tuas críticas ou elogios, quando te espero pela manhã ou nos meus sonhos. Quando conversamos nada e tudo.”

Eu merecia ser tratada assim, com atenção e carinho…

Se não me faço entender, o defeito deve ser meu. O que fazer então? Há que partir, afastar-me um pouco ou mesmo fugir ? Não sei para onde… mas parece a saída mais racional. Se não faço falta a ninguém, para quê insistir?



quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Há dias assim …

 


Há dias assim… em que tudo parece belo e transparente. Há dias em que se diz: vale a pena viver, viver bem, saborear até à última gota de sol , porque o mar estará lá sempre… se não for radioso e azul, será cinzento e revolto , mas permanecerá para além de nós.

E o tempo que nos resta - numa idade em que somos passageiros sorridentes e saudáveis do simpático Navegante - é tão pouco, que importa usufruir sofregamente da vida, criar,  amar , espalhar alegria à nossa volta, cuidar de quem no quer bem, para ser feliz … 

E se o fizermos será essencialmente por nós ( ou seja por mim mesma , que é quem conta para este efeito).


Transparente, solar, lunar, sem nada a esconder e no entanto com tantos mistérios de baixo de água. 

Tomara que eu fosse capaz de ver, na alma de quem quero, tamanha transparência, incluindo as pedras feias e os azuis bonitos.

Tomara ter alguém que me entenda, que veja a beleza onde eu a encontro ou, pelo menos, que discorde das minhas visões. Alguém que me abra os olhos e diga que estou enganada, que não vale a pena ter sonhos para evitar desilusões. Mesmo discordando, que me diga com afecto e pedagogia que o mundo é um lugar vulgar, ao qual se deve ser indiferente, um lugar de passagem e que o mar - parecendo maravilhoso - é apenas um berloque colorido que serve de pano de fundo a um momento agradável, como tomar uma cervejola com uma amiga ou um amigo.

Para quem assim pensa, a companhia é a única emoção que daí vem, os sentimentos são parolice romântica, o objeto da companhia é mais ou menos indiferenciado… mais um berloque na cadeira ao lado - uma conversa leve que anime a bebida, o conforto humano ligeiro, livre e solto… nada de muito importante, portanto. Se possível, saborear o sol e ar azul deste verão-laranja, com poucas palavras. Tudo o que for complexo é dispensável… 

O silêncio, primo da solidão transitória, pode ser a melhor das companhias. A solidão para algumas pessoas não é fonte de angústia ou de insegurança. É um bem. Vive-se, come-se, dorme-se e tenta-se ter saúde para manter a rotina. Regar as flores, já não com muito empenho, nem calor… com uma frescura seca .. porque os tempos estão difíceis, de preferência sem incêndios. (Que chatice)!!! Paixões ardentes nem pensar, os bombeiros andam cansados e já ninguém liga a isso. O melhor mesmo é ser comedido, calado, condescendente, pouco exigente e nada dependente. 

Quem pensa assim, parece um pouquinho egoista, privilegia o seu conforto solitário, grita: Abaixo as prisões e os monopólios! Quanto menor o empenho e maior a diversificação e descompromisso, melhor.

Dividir para reinar!

O compromisso é traumático, dita a falta de liberdade. A baralhação de papéis e horários cria um terreno de permanente susto. Para quem está de fora e pisa território desconhecido, o chão poderá estar minado, haver algo que pode explodir e alguém morrer. Serei eu?

Paz precisa-se… tal como de verão, de mar azul, para banhos quentes e abraços escaldantes (ou mornos !!!) beijos com sabor a roubados , abraços forçados, que podem parecer terem ser desviados da sua rota preferida em migração para outros continentes e oceanos. Nalguns é inverno, eu sei.

Era tão bom que os dias fossem sempre lindos, como uma janela de princesa, aberta sobre o lago, onde tudo parece em paz …



sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Palavras

 


(…) “A palavra é uma asa do silencio,

o fogo tem sua metade fria.''(…)

Pablo Neruda

 Gosto de palavras! Elas preenchem os buracos da minha vida, o lugar onde nada acontece, onde o silêncio e a solidão se instalam e fazem notar mais os vazios.

Por isso, escrevo.

Elas, as palavras, são salvadoras… escrever nas noites longas de insônia ou nos dias difíceis é uma ajuda, quase um acto de sobrevivência. Alinhadas pela linha das constelações celestes, as palavras hão-de salvar, hão-de voar. Assim haja jeito meu, sem atropelos, assim consiga uma saúde de alma lavada, assim haja quem me queira bem, me ajude e me oiça.

Habituada a uma vida cheia, agitada por múltiplas atividades, responsabilidades, stress, preocupações familiares, tristezas e amores complicados, não é fácil mudar para um outro espaço que sendo habitado me parece mais parado. Onde, depois de deixar cair muitas tarefas e responsabilidades, fico só e mais perdida. Feliz pela liberdade escolhida mas onde acabo por esquecer o essencial. E o essencial sou Eu! O essencial sou eu e quem me quer bem.

Quem me observa de fora, julga que tenho tudo - família, amigos, dinheiro e saúde. Não veem os buracos criados, bichados, alastrando como fungos nos espaços que foram deixados pela vida em correria que foi esmorecendo. Porque a nova vida que tenho, pode parecer mais calma mas ainda salta de pedra em pedra, numa busca constante e esperançosa de melhorar... mas já não ri, nem agradece os saltos dos amores, só nos calhauzinhos piquenos recolhece prazer... 

A falta de algo que tinha e que me enchia dos pequenos/grandes prazeres que davam a cada manhã sentido para prosseguir com o dia, que mantinha o equilibrio mímimo indispensavel, foi esmorecendo a alegria de estar viva e deixou buracos. 

Quem me vê, até pode admirar a aura de feliz vivência e bonomia das minhas rotinas calmas e prazeirosas, não sabem nada sobre os buracos e não sabem que os encho de palavras, para fazer voar a Solidão, mascarada de silêncio durante a noite, e vestida de lágrimas caladas, durante o dia.

As palavras são precisas para voar, para afastar de mim o que mais pesa: o lixo instalado nas grutas escuras deixadas vazias pelo desamor e por mil coisas boas que correm por mim ao sol, mas não me conseguem fazer esquecer completamente as zonas sombrias. Aquelas onde semeio palavras porque não sei fazer mais nada. Mas onde preferia semear beijos.

Preciso que as palavras derramadas aqui e levadas pelo vento, varram para longe as caraminholas da minha cabeça tonta.

As palavras são as asas do silêncio e também da Paz, de que tanto preciso, para reencontrar o equilíbrio perdido.

Um equilíbrio que já era tempo de ter encontrado, mas que - por burrice, casmurrice e aparvalhamento afetivo - está difícil de estabilizar e ele há dias em que desatino mais... Agora está difícil...

Ás vezes, destransbulho por motivos insignificantes - um cabelo ou dois (sendo de partes diferentes do corpo) ou ideias que surgem de geração espontânea… vindas do nada (uma memória desagradável, uma palavra inocente ouvida e que cai mal) e então instala-se o medo, coisas inocentemente vulgares que me trastornam demais …

E vem o medo, o pior do bloqueios ... a fonte de toda a angústia.

Um medo que transporta frio, como se fosse um bloco de gelo, um medo que arrefece aquilo que devia ser de fogo.

“ O fogo tem a sua metade de frio”… e eu sinto isso: tenho de ter clarividência para intuir em que casos preciso de cobertor para me proteger, para manter algum calor, para sobreviver evitando, por um lado, que o fogo da paixão arda em demasia e me faça sofrer, mas por outro para tentar que o abrandamento do calor (o esfriamento da outra metade do fogo) não seja demasiado fria. Entre o degelo e o iceberg … lá se vai o equilíbrio instável. 

Palavras são paliativas, ando a enganar-me na doença e na cura!

Preciso de voar mais alto, sonhar com mais força num futuro mais feliz… almejar a nuvem cor de rosa onde alguém goste de mim e me ofereça palavras em vez de flores. Muitas palavras e beijos, mimos e afagos - especiais, artesanais, produzidos só para mim - algo que me eleve e me faça sentir especial e melhor, me faça crescer em amor e força vital. Não bastam palavras e beijos vulgares, não quero uma rotina idêntica a todas as outras, iguais em palavras e gestos aos que são dirigidos, indiferentemente e por indiferença a outros, com a única diferença de se dirigirem as pessoas diferentes… as quais no fundo são iguais (para quem não distingue nenhum ser humano para além de si próprio, e julga todos e todas iguais).

Iguais, iguais, neutras … burras… tontas e carentes de palavras e de toques, falhas de pele, de tempo e de calor humano,  pessoas que não têm o benefício de conhecer a outra metade do frio, que não podem exigir /pedir muito, porque estão reféns da sua ignorância-prisão, e retidas da transcendencia total que é o afeto amoroso pleno, pobres de gozar a vida com as palavras boas, amorosas e voadoras no silêncio… a dois. Todas iguais no desamor... com títulos diferentes: uma reivindicativa radical que corta o mal pela raiz, mas aprecia a docura possivel da amizade, outra uma carente e fantasista que, vestida de bruxa, prega com gengibre afrodisiaco para tentar subir às alturas e fazer o pino possível  (sem afetar o reumático e a osteoporose.....LOL), outra despromovida `categoria de "colorida" que tudo aceita e calmamente espera pelas migalhas de mimo que alimentam a alma e adiam o fim... a morte anunciada a todos... 

Curiosamente, alguns esquecem que a morte está já ali ao virar da esquina. 

Vamos todos morrer a muito curto prazo. Era bom lembrar isso sempre! Ter a noção da finitude para aproveitar melhor o tempo que temos de qualidade. Pensar nisso, mais vezes. Para que se possa viver sofregamente todos os momentos - os dias de sol ou os de nevoeiro - sem cuidar de quem não nos quer bem e nos despreza e concentrando-nos no afeto de quem merece.

O mais triste seria constactar que ninguém merece o nosso afeto, que ninguem precisa de nós - a inutilidade e a invisibilidade total. Aí mais vale fugir, partir, viajar, mudar...

Sentada num sofá, a encher de palavras os buracos do desamor não se vive... tudo é inútil.


terça-feira, 23 de agosto de 2022

Soneto da Fidelidade


Se a fidelidade é uma fechadura, uma tranca que é colocada à felicidade, como entender Vinicius?

Se, por vezes, se arruma a felicidade e a liberdade num cofre à prova de bala, pomposamente apelidado de suposta garantia de infidelidade, como entender quem ama para além dos limites do cofre ou quem acha que a gaiola deve estar sempre aberta ao livre voo dos passarinhos? 

Houvera quem me ensinasse, eu juro querer aprender…

Vinicius de Moraes, 1939

Soneto da Fidelidade

“De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive)
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure”



História Sem Fim

Se eu fosse poeta escreveria versos gloriosos: de amor ou de paixão, de dor e sofrimento, de miséria e superação, espampanantes rimas com laivos cósmicos, transcendentes visões de futuro ou apocalípticas soluções para a Humanidade. 

Poemas que viriam cheios de profundas descobertas sobre a alma humana ou carregados de desalento pela inutilidade de toda a literatura, com a certeza de que a morte tudo apagará e que, no fim, apenas sobrarão os deuses do Olimpo, aqueles que pela sua genialidade  vão permanecer pelos tempos e serão apelidados de “clássicos”. São poucos e bons.

Por isso os invejo. Por isso é inútil escrevinhar estados de alma exarcebados e saloios, simplórios e vulgares …

Não obstante, eles escrevem-se por aí , circulam… cobrem farrapos de revistas que vão para o lixo e enchem de cor - durante 5 minutos - o coração romântico da rapariguinha do shopping, aquela mesma que seria capaz de escrever uma mensagem no WhatsApp destinada ao seu “mais-que-tudo”, com coisas do gênero:

Meu docinho de côco ( se fosse brasileira). É bom gostar de você. É bom sentir-te quente, adormecido e colante ao meu lado… numa cama -ninho onde gozamos a pele e os toques, onde se esbanjam os beijos e muitos, muitos prazeres: falados, calados, sentidos … nossos. É bom ser noite, haver solidão e silêncio e todo esse tempo aparentemente parado, afinal ser um lugar vivo habitado por você ao meu lado… ou muito próximo. É bom pensar que amanhã haverá sol e, se for dia de nevoeiro, o seu brilho cheirará a luz e a manjerico. Porque sol é amor, bem estar e cumplicidade. É bom imaginar que o meu primeiro olhar atontado  será para você, certamente feliz, porque vou ver seu sorriso iluminado e poisar um beijo de sono no seu rosto um pouco rosado, já desperto e preparado para a vida que nos é dado ter. Hoje tudo é bom, porque te sinto, te quero com carinho, te levarei comigo, porque a coberto das saudades ficarás dentro de mim, quente e palpitante, húmido e distante. Obrigada por este dia que foi noite, com amor e paz, amizade e companhia, mar, calma e a doce empatia da amizade que se pode tornar séria.”

Uma mensagem gostosa e sincera, em tom poético, não é menos nobre que um grande poema universal, para quem o escreve e para quem recebe. 

O hoje e agora é que importa. Que se lixe a literatura!

Pode parecer piroso e ridículo (já  houve quem o dissesse) mas é terrivelmente real.

E o pedaço de carta, de revista ou de trapo diria:  

Gosto de ti e da vida! As duas coisas se misturam, o som desta música faz-me voar… Talvez eu no ar e você no mar… talvez um dia nos encontremos em terra… quando estiver frio e a simplicidade de um abraço e a clarividência amorosa nos fizer reencontrar em pleno.”

Talvez sim, talvez não. Porque um cenário idílico, quando projetado unilateralmente, de nada serve para construir um futuro, um futuro imediato e curto - não um futuro "eterno", continuado e igual, monótono e preso.

Este sentir de felicidade é fogo fátuo  - quando só entendido por um dos lados e aceite passivamente pela outra parte. Para o agente passivo, o romantismo nada significa e, aliás, até atrapalha, cheira a prisão e dependência, ameaça de liberdade.

Há, por vezes e nalguns seres, um medo profundo e empedernido, um trauma antigo e latente de falta de liberdade, sementes que o desamor e o ciúme plantaram bem fundo no subconsciente doente. Não se apagará com um poema e que quem vier a seguir ou entende isto ou parte. 

Há terra dura onde a semente nunca germinará. Há verbo que nunca será verso, há música sem harmonia que não fará dançar as entranhas.

Há que compreender e aceitar … ou não… e decidir outra coisa. 

Quem está mal muda-se! Uma afirmativa verdade já experimentada e quem nunca teve coragem de o experimentar, chorará sempre o ter ficado, para evitar a mudança, aguentando o mal.

É humano comodismo e medo de mudança. 

Se assim não fosse, como explicar tanta violência doméstica que é aceite, vivida com mágoa e horror, anos a fio, sem haver um fim. O medo da mudança sobrepõe-se, tantas vezes, ao desafio de uma vida melhor.

Trocar conforto por liberdade é luxo que não está ao alcance da coragem de todos.

Até mesmo quanto tal é possivel economicamente (para alguns, algumas a miséria sobrepoe-se à dor...). Mas tantos podem mudar e vão ficando, acreditando com uma fé desmesurada que alguém vai mudar, que o afecto está escondido e mascarado de indiferença, mas há-de brotar.

E há também quem recorra a ajuda psicologica profissional, para acertar as agulhas conjugais... acreditando que é ainda possivel, que um terceiro agente (o psi)  fará um milagre... que a receita habitual resulta: um pouco de palheta, exercicios metódicos de toques fisicos serão suficientes para recuperar a intimidade perdida, uma intimidade que se calhar nunca existiu...

Não há poesia que resista , não há verso que seja capaz de elevar a um patamar superior uma alma onde  a miséria humana do desamor - tido por normal - se instalou numa rotina de indiferença. 

Os poetas fazem falta? Quantas almas são capazes de salvar? É o fim da história? Não, porque sabemos que a história coletiva não tem fim, apenas a história pessoal se acaba com a vida de cada um, com isso termina o verso de pé quebrado e a tal rapariguinha romântica envelhece mal, porque não leu Shakespeare,  nem viveu uma paixão.




segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Da Inutilidade de um Abraço


As melhores coisas da vida são as que são dadas em vez de recebidas. O afecto sentido ou o abraço dado, por prazer de entrega, não têm preço, nem matéria, nem finalidade, nem obrigação de dádiva, nem compromisso de eternidade. 

Um abraço, um aconchego são um simples pulsar, universo estrelar, etéreo e terreno, espírito transcrito numa dose mínima de matéria, a suficiente para traduzir em toque físico aquilo que as palavras nunca serão capazes de expressar. 

Gosta-se mais do que se consegue mostrar.  É possível enganar por excesso, ou seja, gostar mais do que o enredo da intimidade física indicia e muito mais do que um discurso patético pode levar a pensar.

Um abraço é fraco suporte para o vulcão que comporta… se for verdadeiro e forte, se for assim a modos que … demasiado, excessivo, amalucado.

Os sentimentos - por natureza são de contornos ilimitados - não têm dimensão. O seu tamanho é desconhecido e a sua prova impossível. Da dimensão do Universo, dão-se a conhecer apenas por pontinhos luminosos e distantes, que pouco dizem sobre o seu conteúdo efetivo. 

São espírito quase sem matéria. 

Não fora os gestos que tentamos encenar para transmitir aos outros sinais de uma realidade interior indizível … ficariam inacessíveis e desconhecidos . 

Muitos ficarão certamente…

Muitos sentimentos e emoções (boas e más ) se é que a classificação faz sentido, ficarão para sempre inclusos, enterradas na mente dos seres humanos que os guardam. Por motivos variados: ou porque não têm o dom de os sentir ou porque não têm o talento para os deitar cá para fora. Embrulhados e escondidos, tantas vezes, os sentimentos… aldrabados por quem os ignora ou finge, por quem prefere jogar pelo seguro e não se atreve a encarar o seu semelhante com as cartas todas - coração e mente, convenções e pecado, exagero de paixão ou manias de pirado.

Há quem mostre o que sente de forma mais ou menos limpa e há quem guarde tudo só para si. Todos são respeitáveis. Cada um faz o que quer do seu âmago, do seu sentir mais íntimo. 

Contudo, demasiada guarda pode ser doentia (opinião pessoal, não faz lei). Acumular emoções extremadas pode virar explosão, depressão … Mas olha, paciência, pior para esses pobres coitados. Desses tenho pena (mas talvez tenham tratamento). 

O que me aflige mais são os outros, os que dizem não ter nada para oferecer.

Será que existe mesmo quem não tenha nada lá dentro? Desprovidos dessa gaveta da alma, sem nada  para guardar? Os psi devem saber responder, eu não.

Custa-me imaginar um ser humano saudável e normalmente inteligente possa dizer que não tem nada lá dentro. Vazio! Indiferente à vida que passa. 

Mas admito que haja quem pense assim e se realmente não têm sentimentos nem emoções de relevo ( para além dos de natureza “animal”: o medo, a comida , a sobrevivência básica, o sexo .. ) então, é lógico que não possam expressar, em matéria, um espírito inexistente . Só sai lá de dentro o que lá entrou ou nasceu! 

Contudo, por ironia. os gestos do Vazio podem ser semelhantes (na aparência) aos modos do Real. Tal como o cinema imita a vida, mas não deixa de ser ficção.

É possível e respeitável. 

tolerância,  para com todo o tipo de gente, assim o exige . Mas é pena… muita pena que haja quem passe por esta vida com um preservativo enfiado na cabeça: evita acidentes emocionais, mas retira prazeres maiores.

Tantos vagueiam por aí e, sim, até se sentem bem. Não percebem um abraço inútil porque oco, um beijo em pró-forma porque não tem por origem uma explosão de estrelas interior, nem um tremor de terra emocional que sobe das profundezas do sub consciente. Das entranhas…

De nada serve, eu sei, de nada serve um beijo ou um poema… mas gosto de dar e matam-me a fome. 

A pragmática criada de Sophia dizia que se não fosse ela comiam-se versos lá em casa… e as crianças a crescer, então como seria?

Mesmo inútil, um abraço é bom! E a felicidade pode existir, na simples experiência teórica de haver um objeto amoroso, alguém a quem possa dar um abraço, um beijo, um aconchego mais quente nos dias (ou nas noites) escaldantes. 

Virtualmente ou com um deslisar de pele, por mensagem ou colando uma nudez a outra. Tanto faz, desde que a fantasia se corporize em dom. 

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Dias de Verão



Não sei se algum dia tive a percepção de que o Verão era sinônimo de dias felizes, se antecipei com emoção e frenesim a felicidade potencial, esperada, que as férias anunciavam para o comum das gentes. Elas (as férias) eram um foco de stress, uma ideia ambivalente : ora carregavam angústias, medos, inseguranças e restrições de liberdade (na adolescência, eram muitas e reais, na infância eram assumidas como triviais e não questionadas), ora transportavam a perspetiva de pequenos prazeres : água, sol, banhos de mar, livros para ler e, mais tarde com sorte, umas migalhas de namorado controlado e a saber a pouco… uma sorte amargo-doce…

Nada de grandes viagens emocionantes, os dias eram monótonos e iguais, sempre acompanhada e vigiada … sempre em função dos outros. Sem escolha, sem amigos e sem liberdade para voar. 

Mesmo assim, o calor aquecia os corpos, ficava mais bonita, sexy, a alma voava e os livros servindo de asas … traziam a felicidade possível.

Tinha tudo o que precisava : um cavalo numa certa fase, uma bicicleta, um bote noutra altura junto ao mar … que me permita remar sozinha, afastar-me da costa, atracar nas cordas que delimitavam a zona de banhos da praia que frequentava e mergulhar sem ninguém por perto, vir à tona e retomar o barco que me esperava preso na corda. Respirar e sentir que por, breves momentos , era eu, estava só, em silencio, feliz por ser dona daqueles minutos em que geria o meu destino… curto mas meu - do barco até à praia . 

Era uma felicidade pontual. Outras felicidadezinhas foram vividas, o reconhecimento acadêmico por exemplo, o corpo jovem que me agradava e o sonho, sempre o sonho de que só o amor liberta, só a independência econômica me transformaria naquilo que eu sentia que era, que podia ser, que a sociedade esperava de mim e que eu me teria  como inteira. O amor seria o momento maior, o único objetivo que esperava atingir e que me realizaria por completo… estava predisposta a dar tudo e tudo viver , era o único bem que ambicionava. Tudo o resto, achava que me cairia na sopa naturalmente e sem esforço, carreira acadêmica, investigação, mérito reconhecido pelos pares, trabalho interessante… essa estrada em percorria sem esforço e sem dúvidas… talvez estudos no estrangeiro . Sem pressas e sem me esforçar. Haveria de acontecer algo de bom. Não fixei objetivos profissionais, nem materiais. Andava ao ritmo da onda da vida… das obrigações obrigatórias - que até eram fáceis de cumprir - família e estudo - tudo fluía com relativa facilidade, o que não significava necessariamente prazer. Ia andando… sem objetivos de vida nesse domínio - o curso e o trabalho logo se veria … era fácil e suave o caminho … casamento não era meta que me preocupasse em alcançar (como seria comum entre pares), festas nem sabia o que era, viagens nem em sonhos…

Fácil… potencialmente simples, mas desinteressante, sem desafios nem objetivos… só obrigações, coisas a cumprir - normalmente coisas de “não viver”… não se podia sair, não se podia ter amigos sem prévio escrutínio, não se podia isto e aquilo… a alegria não fazia parte das coisas permitidas. 

Daí que sonhar o futuro e ter objetivos e desejos fosse quase irrelevante ou mesmo inútil   Porque esbarraria num “não se pode qualquer”. 

O momento maior, o desejo forte e implícito em todo o meu ser, aquilo que eu sabia que me realizaria por completo e para o que me sentia preparada (para quando acontecesse) era amar e ser amada. Tudo com muita força, exorbitante e amalucada… a energia vital era tanta que nunca me interessou namoriscar .. andar por aí em festas e coisas light , nada de fortuito e ligeiro estava de acordo com o meu sentir. Não me interessava.

Só o poder de seduzir e a força que esse talento, que sabia incluso, me moviam. Já tinha tido suspeitas desse valor intrínseco, para o qual não fiz nada.  Nasci assim e foi o olhar dos outros que desde pequena me foi mostrando que eu tinha algum dom de atração natural … intuitivamente achava excitante saber que se pode deduzir um homem usando apenas o talento natural ( que suspeitava que morava dentro de mim) . Alguns relances de encontros inusitados, alguns bem nova, devolveram-me em espelho a noção de que perturbava os homens  - sorriso, o olhar e a minha palheta. Apenas ensaiando um requebro de feminilidade, simples, não coquete nem exibicionista. Alguns pormenores - do juvenil ou provocante sem ostentação, mostrando o corpo e não o vestido… os homens ligam mais ao conteúdo do que à forma. Um berloque giro, invulgar e alegre pode ser sem melhor do que uma roupa chique …

Não confunde o interlocutor, põe-no à vontade  não se sente ameacado por uma vamp perturbadora é perigosa. Eu era simples, sorridente, olhava nos olhos a direito, tinha conversa com conteúdo , laivos de inteligente e desconcertante, diferente . E tinha um corpo atraente e não assustador. Pequena tinha muita arrumação, ninguém se sentia diminuído ao meu lado, eu era insignificante e um homem sentia-se alto  ( por caso, regra geral, eram mais altos que a média, não havendo necessidade). Era inofensiva, portanto. Mas com algo que podia semear a suspeita de que para alem de arrumação  tinha potencial de ginástica, flexibilidade física e mental .. e quiçá de cambalhotas divertidas. 

Pouco acontecia, mas o mistério e a esperança de que a caixinha de surpresas desorientava, pela palheta que derramava… podia ser interessante… era uma mais-valia.

Era bom estar no mercado e verificar que tinha algum potencial. Mas eu queria mais - queria o Amor total  a Paixão dos grandes romances  - vida no limite de amar ou morrer, a dádiva por interior, o dar e receber (sobretudo o dar e fazer alguém feliz) porque tinha demasiado afecto dentro de mim para me permitir esbanjar. 

E assim foi: uns olhos verdes, um ar tímido, uma pernas altas, a magreza bonita da juventude   Ombros largos e alma lavada. Apareceu: ele subiu a escada e eu desci, escada larga em redondo de um pátio de lindo palácio.

Já o conhecia antes, breves conversas. Mas naquela subida/descida de ambos, os olhos verdes de pintinhas castanhas cruzaram os meus e eu soube o que fazer daí em diante. Viver! Era a única saída. 

Nada de muito adequado socialmente, pouco me importou… Decidi que a paixão é a felicidade em estado puro e por pouco que dure… deve ser agarrada com ambas as mãos e vivida até ao fundo. Com toda a alma , com todo o corpo … até ao limite em que a psique atinge e transforma o corpo físico, até este adoecer de emoção. Até as hormonas destrambelharem e se tornarem em sangue. Sem relação física, só com toques e pele, só com abraços entrelaçados e não penetrados, o corpo vinga-se e adoece com o transtorno, efeito psico-somático… sinal que só assim eu sou eu: exagerada!

Felicidade são momentos assim… 

Hoje 40 anos passados, tantos abraços e outros amores. Tantas e tão maravilhosas cambalhotas em contextos cômicos, doces, amorosos. Carregados de erotismo. De ternuras.  De paz ou de frenesim, de excitação ao rubro ou de calma de sabor suave. De tremuras maravilhosas internas e de afagos externos. De gritos libertadores do prazer, de beijos silenciosos decidir-se-ão satisfeitos. De banhos quentes a dois. De mergulhos frios no mar, em que os corpos junto aqueciam as águas nuas como nós… de tantas e tantas histórias de amores felizes e desconcertantes, que raiavam a  fantasia… Se não fossem bem reais. Hoje recordo os dias mirabolantes de verão e os dias calmos passados numa vulgar caminha quente com edredão de inverno…

Hoje, aqui e agora, sinto a Felicidade!

A tal que eu costumo dizer que não existe … mas existem momentos felizes.

Tem graça porque o dia se passou sem nada a relatar , não houve sessão de pino,  não houve um beijo romântico à luz da lua. Fui tudo calmo e simples e eu olhei para o espelho e pensei: sou uma velha que se acha nova, bronzeada e gira, que está feliz com o amor que acalma e com a família que tem, com os amigos que se cultivam, com a casa ninho-abrigo que terá,  com um bebê nos braços para ajudar a crescer, com uns anos pela frente que se esperam  ser de saúde e alegria.

E com o mar por perto, com uma companhia intermitente mas amiga, com um certo picante que fomenta o sex appeal provocado pela concorrência … por vezes desgastante e traumática (bem sei… dispensava), com a falsa segurança de que está em paz e segura, de que me vão dar abrigo emocional, por uns tempos. 

A concorrência existirá sempre e é um risco para mim, o vulgar desquite é uma probabilidade sempre presente, porque as pessoas se aborrecem com o tempo. Há argumentos para isso: por um lado, a impossibilidade de uma relação totalmente transparente que inclua a família toda, em vez desta situação de semi clandestinidade. Talvez demore , talvez não venha nunca … se não fosse esta bruxa pairante que tece o vestido de noiva há anos, que preenche mentalmente o formulário do registo e concebe o menu da boda, a qual lhe daria o futuro que merece - o Grande Prêmio Persistência!) …

Mas hoje, todos estes cenários macabros se desvanecem… penso no dia vivido, calmo , rotineiro, sol, comidinha caseira, feita a dois, férias confortáveis … um abraço para adormecer, outos mimos gostados a dois,  felicidade simples .

Hoje a Felicidade apareceu … pode ser que fique . 

De qualquer modo  esta ninguém me a tira. Aperto com força a mão que me segura à vida …