terça-feira, 16 de junho de 2020

Pequenas tristezas


Pequenas tristezas que apertam ao fim da noite.
Porque pequenos episódios aconteceram durante o dia... Não sabendo eu o que lhes fazer, não tendo a coragem de lutar por um diálogo consistente, nú e provavelmente suícida, que poderia resolver a coisa ou quebrar de vez ... fiz uma bola de trapos com as tais minudências que se acumularam, juntando as chatices pequenotas de hoje às suas irmãs gémeas dos outros dias. 
A bola agigantou-se, somando-se às da semana passada - as quais já tinham chegado inopinadamente sob a forma de uma imagem infantil e de fraca arte - enquanto as de hoje, vieram pela romântica  via epistolar à moda antiga, transportando sentimentos que certamente não caberiam num moderno e-mail. 
Aos poucos, dou-me conta que passaram 4 anos, desde o início da vida complicada que a minha tolerância aceitou. Quatro anos de ameaças várias, que se foram transmutando em práticas de agressividade diversa, desdobrando-se numa panóplia de talentos e demonstrações fantásticas, próprias daqueles concursos muito antigos da “Mulher Ideal”, que punham moças e senhoras a competir nos seus esmeros de gastronomia, arte de bem receber, talentos de rendas e bordados, de pintura de aguarelas ou de caixinhas decorativas, de arranjos florais, de poesia e prosa. Recatados como eram os costumes, os dotes de cama não faziam parte das prendas domésticas. 
Eu, perante este exército de ataque bem apetrechado, nunca optei por ir à luta, fugi da concorrência... achei ridículo mas perigoso a demonstração de força dos dotes em parada. Primeiro achei compreensível, fui honesta e tolerante atendendo às “culpas” que tive no desenrolar da história, considerei o facto de ter despoletado uma situção complexa... de ter abandonado (por pouco tempo) o terreno sem fronteiras, nem exército, por onde o inimigo entrou sem defesa que lhe resistisse.
Eu não tinha exército, nem meios, nem estratégia... nem queria guerra. Estava destroçada, perdida e só. Levei algum tempo a acordar para a vida e, quando o fiz, percebi que o terreno estava semeado e os frutos medravam à vista de todos. Em 2 ou 3 meses ... a conquista e a vitória pareciam certas e eu continuava moribunda lutando a favor do meu ressuscitamento.
Depois o tempo passou, as razões para a minha compreensão e tolerância inicial deixaram de fazer sentido... eu voltei à vida, passei a estar “saudável” e disponível. Contudo, apesar das promessas, tudo continuou na mesma. Renasci, mudei, voltei a amar e a desprender-me das amarras antigas, mostrei que era livre e segura, independente e capaz de ter coragem para encetar uma vida nova, de amar a sério, com os talentos que a sorte me deu, com defeitos também... mesmo que não faça bolos capazes de concorrer ao prêmio de mulher ideal. 
Voltei, tentei (e tento) viver bem, feliz e orgulhosa das minhas imperfeições e dotes... sem contudo me conseguir desprender da mágoa presente, que volta sempre para me atazanar o juízo, sob a forma portentosa de uma fantasia amoroso-imaginária que cresceu e veio para ficar.
Cada dia que passa, cada ano mais, maior é a gravidade da situação. Porque de uma chaticezinha que era apenas uma cócega, passou a arranhão que magoa, tantas vezes se abriram as feridas que as cicatrizes já são muitas. 
O tempo tornou uma brincadeira útil e colorida em algo de sério, quatro anos é muito tempo!
Porque aceito isto? Porque o faço? Masoquismo de quem se auto-mutila! É uma doença, bem sei. Há quem se corte, quem se auto-magoe a sério, quem sofra por "desporto", quem seja doido, quem esteja deprimido, quem... quem...
Em que categoria me insiro?
Das doidas sossegadas, que são felizes uns dias... porque afinal ainda compensa, daquelas que se alimentam de migalhas de afecto conseguidas à custa de algum sofrimento auto-inflingido?
Porque não parto de vez para outra vida mais segura, mais calma, com mais afecto, menos inquietude?
Foi há 4 anos, que aceitei viver em estado de "excesso de tolerância", à medida em que me ia apercebendo, com algum espanto,  que o avanço territorial era sério, algo desbragado, com  "lata" suficiente para passar ao domínio público, visto ser publicado amiúde nos órgãos de comunicação, leia-se redes sociais ... lol
Por coincidência (ou talvez não) foi quando comecei  a renascer para uma nova vida e a tentar saber o que queria. Aí percebi que o caminho que tinha de percorrer estava muito ocupado e potencialmente minado. Nessa mesma altura e por razões diferentes, tive coragem para dizer não!
Tive coragem para mudar.
Mudei de vida, fi-lo sobretudo por excesso de quietude, com medo de ficar pasmada nas rotinas caseiras e na morronice de uma vida "normal", familiar, domesticamente clautrofóbica,. Fugi do que era demasiado igual e quieto. 
Troquei conforto por liberdade.
Procurei o desconhecido, a livre descoberta de outros meios e de outras pessoas, procurei a solidão acompanhada, o silêncio enquanto escolha... e fui bem sucedida!
Então porque me queixo? Agora sou uma alma inquieta, quando fui eu que fugi da quietude.
Hoje estou no fio da navalha da insegurança afectiva, eu que tinha quem gostasse de mim com segurança e desvelo.
Deixei de saber o que é o dia de amanhã. Onde estarei e o que farei com o meu tempo, com as minhas férias? Quem gostará de mim? Com quem posso contar para os dias dificeis... e também para partilhar alegrias? 
Troquei o conhecido (e se calhar chato) pelo desconhecido (e certamente assustador...).
Fiz o que quiz, tive e tenho os amores que quiz... mas não me chega.
Sinto que estou no sítio errrado, com as pessoas não totalmente erradas... mas que não são como gostaria que fossem. Claro que as pessoas são elas mesmo e não como gostaríamos que fossem.
Cada qual é uma ilha... e livre de ser como é. Ninguém muda ninguém.
Só eu me posso mudar a mim mesma, partir quando estiver mal, quando tomar consciência de estar no lugar errado ou com a pessoa menos certa.
Não me posso lamentar. Tenho de respeitar a liberdade alheia, tal como devo cuidar da minha.
Se já o fiz um dia e tive coragem de pôr a minha liberdade acima do sofrimento alheio (que certamente causei), também tenho o dever de aceitar que a ação dos outros - sendo livre, honesta e deliberada - me possa magoar.
Resta saber se aguento a dor, se a mágoa vale a pena. Largar as pequenas tristezas - que em certos dias engordam bastante e me tiram a paz - pode ser uma solução.
No entanto, a vida é feita de pequenas coisas tristes e de outras bem boas. 
A praia estava maravilhosa no seu azul de quase Verão e no branco limpo dos areais sem gente, as flores crescem todos os dias com cores novas, a vida rotineira do "come e dorme" segue calma. Falta alguma doçura... mas enfim! 



O pior são as mosquinhas, tristezazinhas chatas como insectos, que picam aqui e ali . O pior é se contraio uma doença alérgica a essa moscaria maluca, de tanta picada que levo.

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