domingo, 20 de agosto de 2023

Invertidos

 


Se até os “invertidos” podem ser felizes, às vezes remando contra os ventos e as marés adversas deste mundo, eu também poderei ser feliz… apesar de, este ano, tudo me sair invertido. 

Estou mais ou menos de pernas para o ar ! Assim a modos que com a vida invertida, vestida com a roupa do avesso, as costuras à mostra , os buracos das bainhas a desfazerem-se, sem cuecas e sem ninguém para me as vestir ou despir, a cabeça tonta por virada ao contrário…porque isto de ter de fazer o pino todos os dias, magoa os neurônios.

E estraga o corpo, além da mente! Pior ainda é o mal que faz ao coração, à auto-estima, ao Eu mais Eu que cada um de nós tem o dever de preservar. 

Contudo, sei que a vida é mesmo assim - umas vezes corre direita , outra fica torta e vemos tudo invertido. 

Os amores viram desamores, as promessas de viagens são desfeitas, nos bailes não se dança, nos bares não se bebe, no fogo de artifício não há outra mão ou outros olhos que nos acompanhe o folgar e a magia da noite estrelada de cores. E quanto aos compromissos - que pareciam firme e solidariamente acordados -  afinal não o eram (eu é que percebi mal, coisa que acontece aos invertidos, não é de estranhar!). Aqueles que estão a direito, afinal estão ao contrário. Parece-me, a mim, sei lá! Eu é que vejo mal e como estou invertida, julgo que são os outros que estão tortos. 

Numa sociedade plural, em que todos, todos, todos têm direito à vida e à felicidade, eu Invertida me confesso, pelo direito à diferença. 

Um dia destes, vou sozinha para a porta da Assembleia da Republica, com um cartaz : sou Invertida, trocaram-me as voltas, mas quero ser feliz. Podem-me bater, que eu não choro. Podem tentar convencer-me que estou errada, mas sei que não estou.

Queria dar a volta e ficar direita e ser igual aos outros, mas se não puder ser, andarei assim de mãos no chão e pés no ar, descalça e nua, de corpo rasante pelo chão, de cabeça baixa, de alma baixíssima… até morrer , feliz pela coragem da diferença.

Feliz pela coragem de saber apanhar a pancada que os invertidos merecem. Afinal eu nem sou lésbica, nem LGBT. Sou apenas um pequeno ramo do grupo do + . Talvez nem sequer o LHBT+ tenha lugar para mim.

Porque as minhas reivindicações nem são nada de especial - apenas gostava que as legítimas expetativas de umas férias no campo, na estrada, no País real em boa companhia, se concretizassem.

Mas foram invertidas as minhas férias. O campo virou praia e as viagens não são para mim, terão melhor destino do que o meu.

Os acordos que eram firmes - bem mais do que simples promessas - foram uma fraude! Até eram programas bons e bem desenhados, pensava eu que com gosto e desvelo. 

Pensava! Mas falhei , falhei em toda a linha … porque afinal há quem pense melhor do que eu e tenha talentos imensos para tudo - desde abrir as pernas a fazer compotas, desde criar viagens de sonho, a saber nadar bem ou conduzir automóveis , Quem saiba inteligentemente oferecer bombons de chocolate em feitio de coração e serem bem aceites, ao contrário das minhas bolachas em coração, que eu estupidamente dei e foram rejeitadas no dia dos namorados.

A solução para inverter esta desconfortável posição de Invertida: A Bondade e a Aceitação da realidade (mesmo quando esta está virada ao contrário dos meus desejos) são a solução.

Porque escassos são os dias que me restam para viver e cada dia deve ser de alegria, não se pode desperdiçar. 

E só a minha felicidade me importa. Caguei para todos ( excepto um - o meu carrasco / síndrome de Estocolmo).

Da família não gosto, eles também não se importam com a minha felicidade e podem bem sobreviver sem o meu amor. Que se desembrulhem. Ajudo solidariamente do ponto de vista material, porque a isso me OBRIGA a lei do País , a moral e os bons costumes vigentes. Faço porque sim, mas não me podem obrigar a gostar! 


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