que eu tenha a coragem de me enfrentar.
que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo.
Que eu encontre o equilíbrio !
Quando as perdas e as nuvens se confundirem no meu céu.
Quando o imprevisível e as ondas do mar se misturarem que nem tintas de aguarela.
Quando a visão me ficar turva de enredos, dúvidas e confusões.
Quando o que tenho para dar, surgir como dádiva inútil à felicidade alheia.
Quando nada parece fazer sentido, mesmo com uma vida de aparente boa arrumação, em que o essencial está no lugar certo ou socialmente aceitável.
Quando as minhas caraminholas se recusarem a reagir ao aconchego do Lexotan.
Quando a resignação saudável não conseguir suplantar a desilusão mesquinha.
Quando quiser ter mais do que tenho e esse mais for totalmente incorpóreo e invisível, vivente no domínio dos sonhos inatingíveis.
Quanto tudo isto estiver assim: preliquitante e instável, espero conseguir, apesar de tudo, manter o meu equilíbrio . Com esforço … talvez, mas com a clarividência da sua absoluta necessidade.
Espero não desfalecer à beira da falésia e cair, em desequilíbrio, nem adormecer nas sombras da indiferença.
Porque se tal acontecer, é sinal do fim, é sintoma de já não me saber levantar, nem luta pelo equilíbrio necessário.
O equilíbrio, aquele ponto neutro - nem bom, nem mau - mas suficiente para criar um caminho novo e sólido, saudável e feliz.
O equilíbrio como base, indispensável para se estar de pé. Para não passar para o lado dos aloucados, distraídos da normalidade.
O equilíbrio - um sitio que não nos dá nem tira nada. mas permite manter a estabilidade.
E a esperança de que - no vórtice de todos abalos e maus ventos - possa balançar para o lado certo .
As viagens são um caminho - entre muitos outros possíveis - para atingir um espaço de vida nova, para ir ao encontro de algum crescimento interior ou para vivenciar um novo sentido de liberdade. Quiçá, para ver e ouvir o som verdadeiro da liberdade, no caso de quem nunca a conheceu ou de quem dela tem uma visão destorcida.
A viagem essa miragem - meio para nos tornarmos melhores, mais conhecedores, mais tolerantes, mais aberto ao mundo, mais sábios, mais preparados para entender e aceitar as diferenças entre os povos e as culturas, a par da diferenças óbvias entre as paisagens e os climas.
Enfim, as viagens são uma coisa boa! Podem melhorar o mundo - o nosso pequeno mundo e o conhecimento que vamos adquirindo sobre o grande mundo dos outros, dos nossos semelhantes, por vezes tão distintos e, por isso mesmo, desconhecidos e potencialmente adversos.
Viajar faz-nos ser (ou devia fazer) melhores pessoas, clarividentes, mais ricos, mais capazes de entender a Humanidade.
Para cada um individualmente a viagem pode ser fonte de riqueza interior, pode ser válida e importante para o equilíbrio emocional e para a auto-estima. E para que isso aconteça, não é necessário ser uma viagem longínqua, exótica ou especialmente aventurosa ou perigosa.
Nem todas as pessoas são iguais, eu sei, há viajantes competentes, com especiais capacidades de planeamento e imaginação para encontrar destinos maravilhosos. Esses conseguem explicar o sonho da viagem de uma forma cabal, transcendente mesmo. Mas não é por isso que são melhoras pessoas do que os outros. Simplesmente têm esse talento, a par de terem tempo e dinheiro para serem um viajante “exótico e profissional”.
Para esses militantes-profissionais das viagens, o que é mesmo decisivo, é ter vontade, gosto pelo desconhecido e espírito de aventura.
E também um certo tique, mania de colecionista. Somam destinos, fotos e relatos como quem coleciona cromos. (Nem todos são assim, felizmente, espero que apenas uma minoria retire das viagens o fogo-fátuo do exibicionismo e da sua prova documental).
Quanto aos verdadeiros viajantes - e por muito que os admire - infelizmente, a experiência diz-me que tendem a ser snobs, raiam a arrogância e até talvez algum desprezo pelos “pobres excursionistas”. Aqueles que gostam de passear, estudar e conhecer o mundo e os povos, mas que, por força das circunstâncias, se limitam a destinos mais triviais - ou por falta de dinheiro, de tempo ou de imaginação para planear voos mais altos. Serão apelidados de rascas, sensaborões ou preguiçosos.
É injusto !
Uns e outros são viajantes. - procuram sair da sua morrinhice, para arejar a alma. Tanto faz ir à Nova Zelândia como a Badajoz.
Tanto uns como os outros são pessoas dignas de respeito (tal como os que ficam no sofá…) e não faz sentido descriminar viajantes em função da grandeza do destino.
Cada um viaja como pode. O que importa mesmo é que algo mude dentro de si, que construa algo de novo, que ganhe novas vivências, novos olhares, que colecione não apenas mapas e folhetos, mas amor - pela natureza e pelos seres humanos -, que consiga mais paz interior, um maior apreço por quem lhes é querido, mais tolerância e não traga apenas na bagagem fotos e souvenires.
Que venham mais ricos pelas pessoas que encontraram, ou pelas belas paisagens que encheram o olhar e a alma de emoções e bons sentimentos.
Que encham a mala de regresso com um sorriso, por ter visto uma montanha nevada, um lago azul. Ou que tragam a tristeza profunda de ver uma criança sub nutrida, procuram sustento numa lixeira indiana.
Ou simplesmente que carreguem a alegria de um saco cheio de caramelos de Badajoz para distribuir pelos sobrinhos mais queridos.
Tanto vale encontrar a alegria nas pequenas como nas grandes descobertas, nas paisagens, no olhar sobre a humanidade mais próxima ou mais longínqua - é igual, é nobre, merece respeito se for genuína a emoção.
O que importa é manter a Alegria e a capacidade de amar e de entender o outro. Não fechar a porta do casulo - o tempo e o privilégio de uma viagem é um casulo egoista enquanto dura - e é preciso continuar a amar o mundo fora dele.
Agir como se fora do casulo não existisse vida e outros seres humanos fossem bonecos parados no tempo, como se a Terra deixasse de rodar enquanto estamos fora, é uma atitude bastante comum do viajante auto centrado ou distraído.
Este tipo de viajante tende a colecionar memórias da viagem e fotos para apresentar como troféus, provas da sua superioridade.
Quando o que importaria era mostrar o resultado da viagem como um presente de ensinamentos.
Uma dádiva para os outros, não uma conquista para si.
Quem mais vê e mais sabe tem o dever ético de partilhar com o pobre, o ignorante, o perdido, o que ficou para trás, sem acesso ao mundo grande das grandes viagens e experiências.
É como deixar um pedinte morrer-nos à porta.
Infelizmente, é o que mais acontece… por isso , há tantos sem-abrigo.
E as viagens podem ser até mais baratas do que a comida, bastam fotos, memórias, conversas e amor partilhado, diálogo e atenção, de quem muito viu e muito tem. Não custa dinheiro, apenas amor.
É feio menosprezar aqueles “parolos” que só fazem viagens mixurucas - ir a Paris ou a Itália, parecer uma viagem pindérica, para que vai à Austrália ou à Patagônia.
É muito triste amachucar o próximo, tirar o orgulho a uma velhota provinciana que conta a sua ida a Fátima, com enlevo, e fazê-la sentir memorizado pela insignificância da viagem, é falta de caridade desmoralizar quem viajou menos, porque a vida ou a falta de jeito não deu para mais. Que pode ter ido “só ali ao lado” mas voltou com a alma mais rica!
A vida é demasiado valiosa e curta. Não pode ser desperdiçada, há que encontrar a Alegria e não dar ouvidos a quem nos magoa com soberba e incompreensão.
Quem trabalhou demais e viveu de menos, é digno de respeito, sobretudo se continua em busca da felicidade… sempre.
Em viagem ou parado a sonhar.
É de apreciar quem consegue modestamente e sem viagens estrondosas, pôr a tristeza de lado, esquecer a amargura provocada pela falta de afecto, e mesmo assim seguir em frente: fugir do mal … fugir… porque andar, correr ou fugir sem sentido, também é viajar.
Procurar a felicidade (a qual não existe, mas que utopicamente perseguimos), sorrir às flores e ao sol, às pessoas boas, aos pequenos sinais que o Universo nos transmite é a melhor das viagens.
Isso é ser otimista, é ter fé na alegria, na solidariedade e no amor. É reconhecer que o sopro da felicidade está não apenas na viagem em si, mas também nas pessoas com quem se partilham essas vivências, ao vivo ou à distância.
Um viajante que se fecha egoisticamente no seu casulo de viagem é um ladrão, porque não transforma em dádiva aquilo que lhe pertenceu mas não é seu - é um bem universal.
Ir em viagem não é o mesmo que ir para um convento em retiro e desligar-se do mundo e dos seus. Há deveres de viajante. Tal como todos temos o dever de ajudar quem mais precisa: família, amigos, desfavorecidos em geral, na medida
Por isso há tantos mal-amados, tanta gente amarga, tanta gente virada ruim pelo muito sofrimento acumulado.
E as viagens podem ser até mais baratas do que a comida, bastam fotos, memórias, conversas e amor partilhado, diálogo e atenção, de quem muito viu e muito tem. Não custa dinheiro, apenas amor.