quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Valete de Copas



O que vale ter um amigo que espera por nós na estação de comboios? 
Vale muito e é muito agradável receber surpresas destas. Costuma dizer-se que “quem tem amigos não morre na prisão”… A mim não me salvaram do xelindró, mas simplesmente aqueceram o meu caminho até casa.

As estações são lugares românticos e a ficção tem explorado isso - sobretudo, a faceta das partidas. Despedidas sofridas, partidas sem retorno, emoções à flor da pele, dramas, saudades do futuro… enfim. 
As chegadas proporcionam menor atenção, são mais prosaicas. É chegar e andar, muitas vezes sem haver comissão de receção à espera. 

Não foi o meu caso. Tinha à minha espera um valete de copas, perfilado e fiel, pronto para me carregar as rosas e aconchegar a tarde.

Um valete um pouco desmiolado(tal como aquele ali de cima), baratinado, que virou pintura abstrata. Um valete que não me via há três meses, quando ainda na semana passada jantámos quase todos os dias.
Estas estranhas cartas de jogar, por vezes, piram. Há que jogar uma nova cartada, mais lúcida e real. 

E que venham mais comboios a apitar e mais lugares de encontro. Porque o melhor do mundo são os amigos!
Depois dos filhos e das crianças...

domingo, 16 de dezembro de 2018

Um Inverno em Paz


Invernoempaz é um conceito. 

Um inverno em paz é um acontecimento real.

Um inverno em paz passou a ser o meu lema! 

Decidi viver o presente, ou pelo menos estou a tentar… Faço por aproveitar o que a vida me dá, um dia de cada vez, saboreando as coisas boas, ficando no prazer da espera de outras talvez melhores…
E no momento presente – o único que importa e existe  por acaso, é Inverno.
Calhou. Podia ter decidido isto no Verão…mas não. 
Coincidência… o que se passa é que é Inverno e eu estou cá, estou dentro dele, quer queira quer não. Por isso, só me resta assumir que estou no Inverno e que por ora é aqui o meu lugar, o meu ninho, o espaço que hoje me é dado para ser feliz. E é neste mesmo Inverno que eu penso, digo em voz alta baixinho para mim mesma: quero paz…
Foi um fim-de-semana de paz. Mais um marco na firme disposição de ter uma vida mais calma, descontraída, sem angústias, medos e inseguranças. Ali no Alentejo extra-lugar… onde extra-terrestres são gente que não existe, não se vê… eu fico em paz, comigo e com os outros. Os fantasmas, que tantas vezes me habitam, saem todos na paragem da camioneta em Évora.
Daí em diante é tudo irreal e verde, porque é Inverno, porque choveu e eu estou em paz.
Ás vezes, as camionetas, no seu vaivém de ir e vir, não levam tudo de volta e deixam resíduos e tempestades, pequenos gravetos largados no meu caminho de paz, um turbilhão visualizado… por dentro…por dentro onde tudo acontece…mas depois lá me esforço e olho pela janela. Lá fora tudo é grande e nada me fará mal. Se dentro de casa me voltar a esbarrar nos despojos de merda, que podem contaminar a minha paz… eu posso abri a porta e sair pelos campos, há uma estrada infinita que me levará a algum lugar, muito espaço a percorrer, talvez se começar a correr lhe ganhe o vício e continue sem parar, sem olhar para trás.
Andar, andar… em frente… fugir sem destino como o Forest Gump é uma imagem tentadora (mas pouco prática). Apeteceu-me fugir por um momento, durante o fim-de-semana que afinal foi de paz.  Num momento difícil, olhei pela janela, senti o impulso de partir, estrada fora e calculei o tempo que demoraria até nem sei onde. Mas respirei fundo e pensei – aqui e agora, no momento presente que é o único que importa, eu estou bem… logo devo continuar assim, aqui. Deixar de pensar na migalha passada que me perturbou, esquecer as palavras e os atos passageiros que me magoaram, já eram passado quando digeri o que ouvi, no minuto seguinte tudo o que incomodou… já era. Logo não importa mais…passou, esqueceu… E o futuro assusta? Quanto a esta migalha de fanico, não me parece que venha a ter consequências. Por isso, esqueci e parti em frente… porque eu quero mesmo e vou conseguir um Inverno em paz.


terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Invernoempaz





Era um dia igual aos outros, de trabalho, de agitação, de pessoas simpáticas ou chatas, de sorrisos e de esgares de raiva, de telefones que tocam, de mails que chegam, de colegas que entram, perguntam e saem, de vida que roda… de doces momentos num telefonema especial, cabido entalado no meio da confusão, roubado ao início de uma reunião ou ao fim de um almoço… fugidio mas bom, íntimo, gostoso e que sabe à sobremesa que habitualmente não como.
É a roda dos dias… a máquina do tempo que passa, cujo ritmo tento a apanhar para não ser trucidada na engrenagem da coisa…
Mas por muito que seja o esforço, a máquina é exigente e complicada… traz muita sofisticação que não me é dado acompanhar, pequenos nadas que complicam tudo…
E a roda, roda, roda… e eu tento correr qual ratinho no cilindro redondo, tentando não parar, fazendo por acompanhar, correr e dançar conforme a música que toca, para não desafinar, para não perder a corrida… aquela corrida a caminho do nada… que todos sabemos ser o fim.
No fundo, penso que se conseguir rodar ordeiramente conforme as regras da máquina, talvez me consiga manter no ar, na roda, algures por aí, sem cair. Sobrevivência, chama-se a isto! Sobreviver é o que todos fazemos, melhor ou pior. Sobreviver com alguma qualidade de vida, em paz, com afetos, com uma base de aconchego familiar, com estabilidade amorosa (a qual sabemos que não existe e quando aparece não é para sempre).
Importa é aguentar sem cair… Pura ilusão, na vida cai-se tantas vezes…
Há que tentar, com ajudas ou por recurso aos recursos próprios que escasseiam.
Hoje a ajuda foram os despojos do dia, de um dia de felicidade. O resto de uma garrafa de champanhe - que serviu para comemorar um evento bom, promissor de esperança e liberdade - esse resto que, em princípio, iria pelo cano abaixo, porque ao fim de cindo dias estaria chocho, afinal estava bem bom! Serve para manter uma réstia de alegria de viver, sempre dá uma ajudinha a combater a tristeza que chegou sorrateira, neste dia de inverno, tão igual aos outros.
Beber só, é triste? Talvez não. Pode ser um momento de libertação, um espaço de reflexão. Sim, porque é preciso pensar, pensar muito e com muita força. Porque se vivemos apenas a sentir … a vida dói. Pensar é como despejar um copo de água fria sobre uma acha que arde na lareira, é abrandar o fogo dos sentimentos e das emoções dolorosas, angustiantes que nos ocupam o coração e, por vezes, se tornam viróticas alastram à cabeça e ocupam o espaço todo. E não deixam dormir, nem pensar com juízo.
Um pingo de racionalidade é preciso. Pensar friamente, pôr água no fogo transtornante, aceso na raiva, no ciúme e na insegurança…
Porque a vida é insegura e eu sei disso. É insegura, é um lugar perigoso, sempre armadilhado para nos transtornar. Apesar de saber, nunca estou preparada para mais um confronto com a realidade que dói, com o massacre dos sentimentos esmagados pela raiva, pela angústia, pela constatação de que alguém nos quer mal…
De repente, o tal dia normal… com a colorida agitação de reuniões e de mails, mergulha no abismo com um simples flash de informação que nos cai, sem ser procurada.
A culpa é da tecnologia que nos despeja em cima aquilo que não queremos ver, nem saber.
Eu bem tento fechar os olhos e esquecer, esquecer que alguém me afasta do caminho, que larga mal-olhados e picos de raiva, só para marcar terreno e desmoralizar quem está bem, tentando, até ao limite, ver até onde vai a capacidade de resistência.
Uma mulher não é de ferro, mesmo quando finge que sim. Uma mulher tem sentimentos e inseguranças que, nos dias difíceis, sucumbem às provocações.
Bem sei que são pobres provocações ditadas pelo desespero, mas magoam mesmo assim.
E preciso de muita racionalidade para me manter à tona, para continuar a rodar na roda da vida, sem cair… sempre em frente, sem sair do meu caminho, olhando o horizonte como um futuro de esperança e vivendo o presente, que é único momento que interessa.
E no presente, eu hei-de vencer! E com força, hei-de conseguir viver um “invernoempaz”.
Um “Invernoempaz” é o meu lema presente…
Um dia de cada vez, fazendo o que é certo, amando quem achamos que sim, partilhando o que temos de bom, deitando o resto para o lixo…
Um inverno quente de aconchego e afetos, de paz, de aceitação dos dissabores, de compreensão por quem sofre, de dádiva por quem precisa, de alegria pelas coisas boas, pelos amigos, pelos livros, pelos escritos, pelo sol que sempre espreita mesmo no inverno. 
Eu quero um inverno calmo, sem gente a espalhar angústia no meu caminho, sem essa tormenta real-irreal que me faz vacilar, sem saber que há quem espere que eu caia...  que me deseja de rastos na lama da angústia e da estupidez, onde tão facilmente me enterro...
Eu não quero ver, nem saber... eu quero esquecer as nuvens negras e as bruxas que largam sapos e penas, que ficam nos cheiros e nas almofadas moles, no trapo e no capacho. E na nuvem, na virtualidade do mundo virtual que nos comanda e come...
Não quero saber, quero viver!


Invernoempaz com ou sem sol, mas com copos e companhia, com mimos e alegria… até mesmo com amor, sim porque ele parece estar ausente, ter perdido o seu lugar central na vida de muitos de nós, parece que vivemos num espaço onde ele passou de moda…