sexta-feira, 24 de abril de 2020

Belgais




Vai-se a Belgais com algumas expectativas, mas encontra-se outra coisa...


Li isto em qualquer sítio e é tão verdade que não resisti a citar.


Porque é deveras difícil descrever o que se encontrou... ou o que se viu, menos ainda aquilo que se sentiu... para além do que se ouviu (Shubert).

Havia todo um ambiente sensorial envolvente e único, mágico, total... Diferente de um concerto, foi mais uma visita a casa de alguém de família, íntimo e requintado. 
Total é uma palavra que não diz nada, mas com ela arrumo todo o turbilhão de sensações, de emoções que senti e para as quais nem saberia encontrar um nome. O nome certo! Todos os nomes seriam poucos, só serviriam para empobrecer o acontecimento.
Um evento que me marcou tanto que quando voltei só disse: ninguém devia ir deste mundo, sem ir pelo menos uma vez na vida a Belgais.

Na semana seguinte, ficámos fechados em casa, todos.
Nos dois meses seguintes, o ambiente ficou pobre, viciado e doentio. O confinamento social amoleceu-me a mente e a capacidade de gritar ao Mundo que existe Belgais! 

Porque nós todos, nós e essa gente que não foi a Belgais, passou a só ver medo e morte, a sofrer, a desenrascar-se para não sofrer, a ajudar os outros quem podia fazê-lo... a tentar ser normal em letargia, a tentar trabalhar mais do que seria normal, a comprar o que não havia, a inventar alegria e música virtual, a encontrar amigos à distância de um clique informático, a fazer pela vida e a fugir à morte. 


Música é vida, música há muita (tal como os chapéus...), mas Belgais só há um.




"Sobre o poder encantatório da música disse Homero na Odisseia. 
Era tanta a beleza, a doçura, o fascínio e o feitiço do canto das sereias que, para não correrem o perigo da atracção e da morte, Ulisses ordenou que tapassem com cera os ouvidos dos marinheiros e a ele o amarrassem sem possibilidade de fuga ao mastro do navio.

O belo abre a porta do que normalmente, no meio da banalidade rasante, se não vê nem ouve. Mas, quando se viu o invisível e se ouviu o inaudível e a sua beleza, tudo se transfigura e reconcilia. Este mundo torna-se outro, sem deixar de ser este. Daí, a exclamação de felicidade, que também os discípulos experimentaram, aquando da transfiguração de Jesus: "Como é bom estar aqui!"

A citação é de Anselmo Borges, não fui eu que escrevi este belo texto, nem o faria por razão religiosa, mas curiosamente seria capaz de dizer o mesmo, no fim daquele acontecimento mágico de Belgais : Como é bom estar aqui!

Como foi bom e inesquecível: pela beleza do lugar, pela companhia amiga que coloriu dois dias de calor e amizade, de coisas boas, que potenciou Shubert, tornou o sol mais quente e a vida mais bela.
Corria entre os campos, o som do amor e dos bons sentimentos, as claves eram de sol, as notas eram de beleza e amizade...
Venham mais vezes, sonhos acordados povoados de amigos e magia musical, mesmo sem Belgais, lugar de encanto e de amor!


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