terça-feira, 14 de novembro de 2017

O que eu aprendi... até aqui chegar




O tempo passou, passou muito depressa e eu não fiz nada!
Não sei se aprendi muito, mas pelo menos aprendi que não fiz grande coisa.
Ou por outra, fiz mais ou menos o que toda a gente faz, mas sem grande gozo, muita pressa, muito trabalho e poucos resultados.
Há quem tenha feito muito menos do que eu e se sinta feliz, realizada... Eu sei!
Mas cada qual é como é. E eu sou dada à insatisfação, à angústia existencial de querer o que não posso ter, à ambição (desmedida!) de ser mais... Mas mais o quê? De fazer o que não fiz e devia ter feito. Não sei muito bem que mais devia ter feito, mas sei que não o fiz. E sobretudo sei que o pouco que fiz não foi por mim, foi para a plateia dos meus espetadores: família, profissionais e amigos.
Não sei o que aqui faço, o que sou, nem para onde vou... O que demonstra bem alguma confusão mental. Pode ser triste mas é verdade.
Contudo, não me parece que seja necessariamente triste, é apenas uma constatação de realidade. Sofrer de dúvida metódica pode ser útil, pode ser que seja um incentivo à descoberta, que promova a busca, a andar para a frente... a caminho de lado nenhum.
Lamento não saber transmitir o pouco que aprendi. Sim, porque alguma coisa devo ter apreendido... para aqui chegar. Aprendi a sobreviver, razoavelmente bem. Tenho obrigação de ensinar, talvez. Ajudar outros a serem felizes, por exemplo.
Mas será que alguém quer aprender ou será melhor que cada um apreenda por si e recomece tudo de novo? Que aprenda na vida , na sua, tal como se não houvesse passado e a humanidade tivesse nascido hoje. Com um olhar límpido e novo, sem saber o que outros viveram ou têm para ensinar. Ninguém quer ouvir, ninguém gosta de ler... ou de aprender. 
Eu própria apreendo mais comigo mesma... 
Contudo, ainda tenho a petulância de pensar que o pouco que sei, o pouco que aprendi para aqui chegar tem algum valor... e que me compete transmiti-lo a quem queira apreender. Mas não tenho a certeza: nem se apreendi algo de útil, nem se existe quem queira apreender. Não tenho a certeza se não será melhor começar tudo de novo... como se cada geração viesse para começar do zero, como se o saber acumulado não existisse. Será isso esmagar a sabedoria e a cultura? 



quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Ciúme




... e saber onde esteve, para onde vai, com quem e porquê...
Não, ciúme não é nada disto!

Ciúme é ausência!
Pura e simplesmente vazio. É um buraco, enorme ... que se alarga à medida que a dor se instala. Um buraco sem nada lá dentro, que cresce, abrindo-se qual cratera de vulcão... sem chama nem lava.
Que queima, tal como a terra de um vulcão recentemente extinto, calado mas presente.
Um grande buraco no lugar onde devia estar o amor, mas não está! Porque esse fugiu, talvez porque o deixámos partir... sabe-se lá para onde. Um buraco de insegurança e desamor.

Um vazio que, no entanto, poderia ser preenchido...
Poderia talvez ser preenchido com saudade, a qual também dói mas sempre é uma dor melhor do que o ciúme. E tem cura, a saudade!
Basta esperar... retomar a ligação, aproximar corações, partilhar ausências como se presenças fossem.

Ciúme é um disparate enorme, por ser uma coisa sem existência real. Um vazio inútil. Se pensarmos que há tanto para meter no buraco, tanto amor por aí perdido, tanto trabalho bom para fazer, tanta gente para gostar... 

Porque não dispersar o ciúme, convocando todos aqueles que podem encher esse vazio de afectos?
Porque não aprender a partilhar em vez de exigir exclusividade? Porquê esse apego aos bens seguros, quando a vida é feita de insegurança e surpresa? Bem sabemos as pessoas passam nas nossas vidas. São livres de ir e de vir, de gostar de uns e de outros... Não somos donos de ninguém.

O que fazer se ciúme é desejar o que não se tem, porque se perdeu? Ou querer só para si o que legitimamente não lhe pertence ...
Como curá-lo então? Não possuindo nada... Sim, é essa a solução. Quem não tem a propriedade não a perde. 
O usufruto dos afetos preciosos é transitório, como tudo na vida... Talvez a solução seja dar, livremente, acreditando que é uma concessão por um momento, de passagem, para que outros beneficiem do mesmo que nós, porque é bom.
Porque gostar é dar. E ao dar, ao partilhar, o ciúme talvez se esbata...

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

O peso do amor




"(...) farei o possível para não amar demais as pessoas, sobretudo por causa das pessoas. Às vezes o amor que se dá pesa, quase como uma responsabilidade na pessoa que o recebe. Eu tenho essa tendência geral para exagerar, e resolvi tentar não exigir dos outros senão o mínimo. É uma forma de paz..."
Clarice Lispector

Tão verdade! Tão sensato ... e tão difícil de cumprir.
Como se isto do amor fosse uma decisão racional, como se fosse uma coisa que se compra na praça, na dose certa, adequada a cada caso. Como se fosse possível pesar o amor na balança das batatas e pedir ao merceeiro: um pouco menos, por favor, não quero tanto, pode fazer mal ... não quero que os meus mais queridos tenham uma indigestão! 
Não, não é possível regular o amor. Porque ele é algo que nós mesmo inventámos, que criámos para ser grande, excessivo, disparatado e irreal. Por isso, ele tem o tamanho que tem e ponto final. Mas é possível fingir.
Sim, isso é boa ideia - fingir, mentir, reduzir a dimensão do sentimento ao ponto de ninguém o ver ou ver pouco... transformar o amor assim a modos que numa coisa modesta, bem comportada, pacífica, arrumada no seu sítio. Um sorriso em vez de uma gargalhada ruidosa. Um tímido e sossegado esgar, doce, mole, limpinho, jeitoso... que não assuste. Porque um amor gritante e desarrumado é muito assustador. Sobretudo para quem é objeto desse amar tresloucado.
Todos querem paz e desresponsabilidades... 
Ninguém quer suportar o fardo de ser demasiado amado, é uma canseira, um medo, uma prisão. Um coitado, vergado ao peso de um amor em demasia, começa por gostar, depois sente um dever de retribuição que, se não está ao seu alcance, o fará sentir sem jeito, apoucado, em falta. E vai daí, não gosta! Então das duas três: ou foge, ou torna-se mau, ou assobia para o ar fazendo de conta que não sabe que gostam dele. Esses são os espertos, aproveitam o doce maná que lhe é destinado. Esses são os fleumáticos, pragmáticos...sem complicações românticas... saboreiam um pouco do amor que lhes és dado e acreditam que aquilo é tudo.  Fingem aceitar um amor do tamanho certo, que é a justa medida do peso da responsabilidade que aguentam. O peso certo é o que dá liberdade, prazer e não exige muito em troca. 
É melhor assim: um fingindo que tem pouco para dar e o outro aceitando a dose certa ... aquela que coloca o fiel da balança no ponto certo, nem demais, nem de menos. Em paz! Cada um dando o que o outro quer. 
Só um louco apreciaria a loucura de ser objeto de uma paixão desmedida, desequilibrada. A menos que sejam dois, dois a inventar um disparate desmesurado que julgam transcendental, oferta dos deuses... mas que é tão só pura invenção de mentes esquisitas.
Só dois loucos debaixo de uma chuva de estrelas...