segunda-feira, 27 de junho de 2022

As Armas Nucleares, as Bruxas e o Olho Turco


Já escrevi muito sobre bruxas, já tirei muitas noites de folga para insônia, discorrendo em susto, em trauma de angústia, em delírio… sobre bruxas. 

Acordar para não dormir, rebolar em sonhos vivos para não me afogar em raiva, esbracejar e afastar morcegos, tentando manter alguma compostura e ficar à tona das ondas mais bravas, na tempestade dos sentidos.

Pela noite fora, se negra, martelar o teclado de dor para espantar a solidão e sobreviver ao medo. O medo da bruxaria invisível, candente… mais imaginada que real, mas desconfortável e assustadora … 

Contudo sobre armas nucleares, acho que nunca disse nada! Talvez porque não acredito muito nelas (ou seja no seu uso efetivo)…agora que as há, há. A gente sabe que sim. Deve ser verdade, pois se países militarmente poderosos acenam com a ideia de que uma vez produzidas, foram testadas em pequenos exercícios de treino, em laboratórios reais situados em locais tão distantes e obscuros que nunca percebemos muito bem onde ficam ou se existem. E existindo, estão tão escondidos e cercados de nada (mar? deserto?) que não incomodam ninguém… acabando por ficar no limbo das coisas vagamente irreais.

As armas só se tornam “visíveis”, ameaçadoras quando estamos em guerra, como é o caso presente… porque exercícios de treino parecem notícias insignificantes. Agora, hoje e aqui, ou muito perto mais para ali na Europa, tudo parece mais real. 

As armas nucleares começam a parecer-se com as minhas bruxas - dão que pensar, tiram o sono e fazem acreditar que o feitiço pode mesmo funcionar e rebentar, basta um bruxa louca chatear-se com a humanidade e pum!

Também há dias, uma bruxa verdadeira, louca, velha e cigana - tudo ingredientes que uma boa bruxa deve ter (não reparei se tinha vassoura) -  veio por aí e matou brutalmente e em força. Um susto! A prova de  “pero que las haylas hay”, sim senhor. 

As bruxas tal como as armas só são verdadeiramente perigosas quando atiram a matar … Ler a sina e anunciar catástrofes, ainda vá, o pior é que antes disso ameacam, torturam, assustam… Sabermos que existem, que estão negras e bravas é suficiente para dissuadir, para mudar comportamentos, para fazer das vítimas potenciais pobres alvos indefesos - pode ser uma pequena criança ou um grande povo.

O medo tolhe, a fé na bruxaria é real, a crença na tecnologia malevola é real … mesmo que a probabilidade da explosão acontecer seja baixa.

Em geral, ouço dizer : Ah, eles não vão carregar no botão do tal míssil de destruição total; ah, a bruxa faz chantagem mas não tem coragem de ir às últimas consequências. Até que um dia acontece . E a ameaça dissuassora  transforma-se em crime, a chantagem/extorsão  por meia dúzia de patacos transforma-se em sangue infanticida… O imaginado potencial vira real.

É quando o medo deixa de o ser e passa a ser uma paz real e dolorosa, não mais ameaçadora… porque tudo o que de pior poderia acontecer , já aconteceu.

Então aí, o medo voa e resta a dor da realidade cruel. É uma especie de paz, o pior já passou … o mal veio para ficar, resta a memória e a perda, o vazio …

Quando digo que tenho medo das bruxas sobretudo daquelas que não tendo vassoura andam a cavalo de outro tipo de veículo, acham-me parva. Tal com me gozam por trazer ao pescoço, por vezes, um olho turco... maior ou menor, à vista ou não. Para que serve, perguntam? - Para me proteger do mau olhado, da inveja, do destilar de alguma mezinha bruxeira… Sei lá! - Não acredites, respondem. Tudo tretas… és parva!

Também há quem não acredite na virgem da azinheira,  no milagre do sol, etc. -  parece bruxedo - no entanto o espaço da azinheira cresceu e cresceu e há dias em que não cabe lá mais ninguém…

 Os milagres resultam ou não ? São melhores ou piores, mais eficazes, que o meu olho turco? (Tenho vários… por aí espalhados - turcos, gregos ou do chinês, tanto faz…).

Para que serve então ter sempre um “olho” perto de mim ? A mim não me serve de nada, nem acredito nas suas benfeitorias. Mas é uma arma… dissuasória.

Uma verdadeira bruxa (se o olho turco vir) reconhece o seu poder maléfico-protector e pode ser que o entenda, senão como uma ameaca, pelo menos como uma força potencial de segurança e defesa.

Um país se defende dizendo que tem um bomba atômica (nem precisa de a mostrar)… sei lá se existe ou em que bunker a guarda.

Eu me defendo deixando intuir que para bruxa, bruxa e meia… sendo que a “meia” é uma coisa redonda, em cículos de dois tons de azul e branco e … pode explodir !!! Qual bomba!

Não se metam comigo, tenho olhos imensamente potentes … se for preciso carrego no botão. A bruxa bem pode pegar na vassoura e voar para mais longe…



sexta-feira, 17 de junho de 2022

Paleta de cores



Se fosse meu, o sonho desta noite , 
seria um bem, bem meu, apreciado, 
seria um sim, 
Teria sido dado ou talvez emprestado…

Mas o sonho desta noite não é meu, nem é teu, nem de quem o habita, preenche ou enche… de luz ou de sombras, de coisas reais por imaginadas.

Se fosse meu, eu pegava nele e dormia, se fosse meu eu dançaria com ele sob a forma sem forma que é a forma que todos os sonhos têm, flutuando na sensação de que são ar.

 Se fosse meu, eu sonhava o meu sonho todinho, sem parcimônia, como se de coisa minha se tratasse e acordava a sorrir, ou acordava esquecida - que é o que acontece aos sonhos bons das pessoas em paz.

Ou não acordava sequer… surpreendida talvez por ter chegado a um lugar sem sonhos, nem meus nem dos outros, um lugar de nadas, nem de trevas nem de pesadelos. Um lugar sem cores, onde seria impossível pintar o meu sonho de cor de rosa, aquele que não tenho mas tanto queria abraçar … onde estaria mais longe ainda, na distância do impossível. Pois se os sonhos são imateriais, não se pintam nem se abraçam …

Cairia naquele buraco para além da vida, sem sonhos, sem insônias,  sem gente … e sem ti, que te infligiste a decisão de ser azul, não ter sonhos muito menos rosa.

No entanto, mesmo quem dorme na placidez do mar e sonha que não tem alma, vê no fundo desse “qualquer coisa”, bem lá dentro, um som que clama e tem cor, riscas coloridas … umas mais berrantes, outras em tom pastel… mas uma cor de cada vez, sem as misturas nem as exaltações que, às vezes, as cores gostam de ter quando se emocionam, agitadas e baralhadas pelo pincel no sua paleta confusa e suja. 

Quem nega o sonho se julga mais calmo, na superfície, desconhecendo ou fazendo-se esquecido da vivência na caverna do inconsciente, bramindo às escuras nas noites sem sonhos e sem luz, sossegadamente, fingindo que os sonhos não existem… mais vale negar por cautela, não vá as cores e as emoções acordarem, se entusiasmarem e se vingarem da palidez do pastel.