sexta-feira, 21 de maio de 2021

Francisca

 


Virei Francisca! Que na minha escala de valores significa ser uma amiga anódica e indiferenciada. 

Uma amiga sem conteúdo amoroso nem desejo sexual, apenas uma compincha. Baixei de estatuto : antes, eu  era ( ou sentia-me como tal) um elo de uma cadeia amorosa , respeitada e considerada num patamar decente , era Eu, sentia que era mulher amada, gostada, privilegiada, uma amiga especial que vivia embrulhada numa cápsula afetiva própria e especificamente desenhada para me agradar e para eu lhe agradar, uma pessoa respeitável a que ele destinava uma réstia de algum amor e que não era passível de ser confundível com amizade simples,  com condescendência para  com outras situações congêneres  que o rodeavam (assediavam).

Eu sentia-me diferente e melhor do que a concorrência. Apesar do equilíbrio nem sempre fácil e da originalidade da situação, sentia-me mais ou menos segura e conformada com situação. Porque me via num lugar de poder de supremacia relativa.

Este ponto sempre foi para mim importante - ser a mais querida e importante... o resto era poeira... companhia avulso e pouco marcantes. As outras eram seres sexualmente pouco interessantes, dispensáveis até,  ou pelo menos que ficavam aquém das minhas claras vantagens competitivas. Segundas linhas incapazes de me fazer sombra e que só eram chamadas para tapar buracos. Eu tenho consciência de que não posso nem devo estar sempre presente e que ele precisa de diversificar e divertir-se, quando eu não estou. Tenho família, trabalho e assuntos meus a resolver. Não vivendo juntos  é natural que não esteja sempre disponível e percebo que quem tem mais tempo e não tem dependências, possa ser recrutada para suplente com maior facilidade. 

Enquanto me senti amada e privilegiada, estava feliz e aguentei as pequenas chatices e rasteiras que ia encontrando pelo caminho..,

Houve momentos melhores e piores, sou rija mas o meu grau de tolerância tem fraquezas.

Agora já não sei! Sinto que a relação está em down grading. Tanto faz estar por aqui como não. Sou uma companhia indiferenciada. Ele tem melhor substituta... não diz que estou a mais ... mas na prática se não estivesse, não faria falta nenhuma.

O discurso oficial é que somos ambas iguais e dispensáveis. Amigas assexuadas para fazer companhia nos tempos vazios. Mais ou menos como um cão de companhia.

Temo que não seja bem assim e que ainda haja pica pela outra enquanto que eu seja só a chata de serviço...

Pensado bem, sou cobarde, não tenho coragem de partir ... de vez.

Acresce a tudo isto o manto horrível da clandestinidade... se sou livre, porquê andar escondida?

Não apresentar família e conviver com amigos, é tabu? Ele acha que isso seja visto como um compromisso. E que não quer!

Mas o compromisso existe sempre que há um relação de qualquer natureza. E os compromissos desfazem-se quando é preciso.

Não percebo qual o problema de uma relação amorosa (mesmo não formalizada de modo convencional) ser apresentada publicamente. Se lidamos com gente civilizada e aberta, é normal darmo-nos a conhecer... e quando a relação acaba, também é normal os outros saberem. 

Para os outros é indiferente, comentam, aceitam e esquecem.

O problema é apenas para os envolvidos. Uma rotura custa, pelo menos a uma das partes - à que foi mal tratada e é deixada para trás. 

Mas tudo se ultrapassa. E é melhor uma rotura clara, consensual e amistosa do que as meias tintas que só servem para criar uma angústia permanente, dolorosa e desgastante!

Estou a envelhecer... sinto que mais depressa do que quando era feliz. 

Vê-se no corpo mal amado. Nas rugas do desgosto. No amargo da boca que já não ri... como dantes... só reclama. Debita queixas azedas... porque o amigo que ama, não cuida, não respeita. Sinto-me azeda como leite não  bebido... coalhado de lágrimas e indecisões.. De ciúmes e de impotências. Sou totalmente incapaz de explicar ao menos o que sinto ou meus pontos de vista.  

Queria ser amada mas não posso exigir amor quando ele não existe para mim.  

Peço ao menos ser compreendida... ao menos, alguém que me ouça e me entenda - aquilo que desejo é tão pouco e tão difícil de obter. Sou muito sensível e mostro pouco, tenho tanta falta de  jeito. Sou tão elementar e naif que facilmente serei suplantada pela profissional da putice, aquela que se arvora em ter por profissão ser amante de homens mal casados.

Profissão muito nobre, porque há muitos homens a precisam de amor e carinho...

Aprovo esse tipo de obra de caridade e deve ser pago. Em espécie, em proteção futura, quiçá em casamento. É justo porque não há cambalhotas grátis ! 

Mas neste caso, dispensa-se tal profissional - nem ele é “casado”, nem está mal tratado. Opinião subjetiva, claro! Eu acho que o trato bem, com amor e carinho, eu acho-me perfeitamente competente para lhe dar prazer na cama. Se peco, será talvez por excesso, por overdose de amor e dedicação. Excesso talvez mal compreendido por quem tem poucas necessidades de afectos.

Pelo menos, é esse o discurso oficial... apesar de eu intuir que o carinho da concorrência é bem recebido e sexualmente consequente. Há uma dislexia nisto tudo que me ultrapassa...

O que está errado comigo, o que posso fazer para melhorar a minha vida e a dele?

Que caminho seguir?


terça-feira, 18 de maio de 2021

Sol de Amigos



Em dia cinzento, fez-se sol!

Os amigos têm este bónus dentro de si, muitas vezes sem o saberem são os transportadores do sol, da alegria dos raios gâma e das ondas beta... do ar de afectos tão necessário à vida.

Hoje fez-se sol... correu um mar de amizade e frescura...

E foi mais um dia, que seria teoricamente chato de tele-trabalho e de quase confinamento, interrompido por breve horas de intervalo ao sol... ou à sombra, já nem lembro.

A memória fixou um momento bom e a noção (tantas vezes esquecida) de que o que importa é viver o presente, um dia de cada vez, sem olhar ao que aí vem, sem ter medo do futuro. 

Curiosamente, pouco me rala o passado, não sou muito de lembrar nem os bons, nem os maus momentos. Não crio depressões retroativas.

Preocupa-me bastante mais o dia de amanhã e o facto de hoje, no presente, não ter um chão. Vivo como se estivesse em viagem, com tudo o que as viagens também têm de bom, a mudança, a surpresa, o conhecimentos...mas também o que as viagens trazem de insegurança, de necessidade de improvisar, de contornar os obstáculos que vão surgindo... e, qual turista, vor andando sem que haja alguém ao meu lado para me ajudar a orientar, quando me perco nessas ruas desconhecidas que a minha vida tem hoje.

Não tenho casa, nem uma envolvente estável de afectos, a família está dispersa, o emprego em phasing out, não há hobbies empolgantes, nem objetivos de vida que me levem a levantar da cama de manhã, com alegria...

Acordo e é apenas mais um dia, com ou sem sol. Hoje foi um dia bom.

Amanhã posso vir a apanhar uma trovoada, tem havida algumas ultimamente e no horizonte dos próximos anos avizinham-se algumas borrascas...

Será que um raio ainda me vai atingir e derrotar de vez?

Ou será que ainda tenho hipóteses de ir atrás de um arco-iris?